21/12/2014

E estava um sol tão bonito

Encontrei-a mergulhada, inquieta, muda, com aqueles olhos.

Deu um grito, assustou-me,

Não me grite, que eu tenho medo.

E abracei-a.

Tenho tantas saudades suas.

Ela não volta. Nunca mais vai segurar-me na mão para atravessar a rua. Agora segura-me a mão, porque precisa de se agarrar à vida, ou apenas sentir - pelo cheiro das minhas mãos - o que se passa lá fora. Não volta, nunca mais, a conversar comigo. De vez em quando mergulha e desaparece, chego a desejar que estivesse demente. Ao menos vivia uma alternativa que podia ser - queria eu que fosse - mais alegre. 

Se me volta a gritar, ponho-a de castigo.

E rimo-nos muito uma para a outra.

Não foi essa a educação que eu lhe dei.

E rimos mais. Eu muito mais. Ela dá aquela segunda gargalhada - ou já só ri de me ver rir - e volta a mergulhar. Quero puxá-la para a superfície, mas ela começa a, sem querer - tenho a certeza - puxar-me para o fundo com ela. Ainda assim, rio-me mais do que a piada que a piada teve.

Agarro-a quase ao colo e passo-a da cadeira de rodas para um cadeirão. Avalio-a para 35 quilos. E digo-lhe: 

Gorda.

E ela volta a dar uma gargalhada. Uma única. Mas então, insisto. Não estou satisfeita.

Está gordíssima. Já olhou bem para esses braços e essas pernas?

Olha para eles, cheia de tristeza, e ri-se para mim. 

Quero treinar as forças e a estratégia de a levantar da cadeira, para a tirar dali no Natal. Quero dar-lhe  o colo que ela nunca mais me vai dar a mim. 

Logo agora, que eu precisava tanto.

8 comentários:

  1. Tu tens força, companheira! Beijinhos

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Tenho pois. Nem que ela pesasse 80 quilos!
      Obrigada, companheira. Beijinhos

      Eliminar
    2. Eu sei, tenho a certeza disso :-)

      Eliminar
  2. Vou só deixar um beijinho e desejar força.
    Gábi

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigada, Gábi. Não me pode falhar.
      Um beijinho.

      Eliminar
  3. Pois é... eu isto não consigo comentar assim como gostaria, porque ficam-me as palavras embargadas nos dedos e a alma das letras turva nos olhos.
    Essa coisa das mães e das filhas é muito avassalador.
    Um abraço do tamanho desse querer.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Comentaste na mesma, com essa tua arte tão especial.
      É um amor tão grande, que achamos que só pode ser assim pelos filhos, depois vira-o do avesso e ele é tão bonito e tão gigantesco do outro lado, que é o dos pais. E esmaga-nos.
      Recebido, sentido e correspondido.

      Eliminar