23/01/2020

Sobrevivi à não entrada na segunda década do século

É que há quem diga que entrámos na segunda década, mas eu professo aquela outra teoria de que só de zero para um é que passamos a contar o um, portanto ainda estou na primeira década do século, já vocês não sei.

(Este post também poderia chamar-se Eu tenho problemas com médicos #365, mas derivados a desconfiar que quem nesta relação tem os problemas são eles comigo, decidi colocar outro título, aleatório, como quase todos, porém certeiro.)

Iniciei o ano com mais uma gastroenterite, o que não me valeu de nada, pois, desta vez, só me deu fome. O meu estômago parecia um recém-nascido, a pedir alimento a todo o instante, foi uma fortuna só em pastelaria. Fiquei mais gordinha, de um rechonchudo comovente, pelo que terei de tratar do assunto, não sei exactamente por que via. Já faço desporto que me baste, continuo a correr os meus 5 km uma vez por semana (outro dia corri 6 porque me enganei nas contas, e não foi dramático), fora as aulas de dança, mais as da bola de Pilates (o magro) e alteres, mais a piscina e o genital. Alimento-me sem grandes disparates, portanto só o avanço da idade é que justifica que não emagreça, mas caguei (não literalmente). 

Mais ou menos em simultâneo, tinha um sinal no pescoço que foi crescendo em comprimento, e embirrava com as golas, os colarinhos, o cabelo, os colares, os lenços, o cinto de segurança, em suma, comigo. Um dia fartei-me, liguei para a minha Derma e lá fui tirar o coiso. Ela pôs-se a desinfectar a zona com um algodãozinho, e nisto o sinal caiu-lhe não aos pés, mas no próprio algodão. Fim. Nem tive que pagar a consulta, um show. (Devia ter trazido o sinal para mandar fazer um pendentezinho para um colar, mas só me lembro dessas coisas quando os meus restos já estão no lixo hospitalar ou sei lá para onde vão estas relíquias.)

Passados uns dias, fui ao meu Vascu, aquele que me pica os derrames, a ver se não chego ao Verão com duas chouriças de velha. Quando entrei, verifiquei que o cinzeiro que costumava estar cheio de bombons com os quais eu enchia os bolsos, tinha apenas quatro. Para não dar muita cana, retirei três e queixei-me que havia poucos chocolates no cinzeiro. Vem de lá a mulher do médico (categoria que, como se sabe, tem um curso de Medicina tirado por osmose, embora esta seja mais cartomância, vidência e, nas horas vagas, assistente de consultório) e diz-me que já tem muito poucos, que posso provar um, mas não posso levar para casa. Imagine-se. Entretanto, a minha consulta estava marcada para as 14:30 e eu chegara às 14:20, pelos vistos para levar com estes contratempos. Então, ainda eu não rarefeita do choque, pergunta-me ela assim: "A senhora das duas ainda não chegou, quer esperar ou entrar já?". Eu juro que só vi uma galinha à minha frente, vá que não sou de torcer pescoços, por isso respondi, impávida: "Esperar para quê, Dona Senhora? É óbvio que quero entrar já". Só que a campainha tocou, a das duas entrou às 14:25, de modos que me calhou uma espera de meia-hora totalmente sem lógica, durante a qual, à falta de mais o que fazer (havia sido brindada com "a última", onde constavam notícias do género que Cátia Aveiro fez uma descrição da sua primeira vez com o último engate, "Foi numa cavalariça e quiseste logo montar" e também de que "Ângelo Rodrigues tatuou a perna que infectou", tudo coisas para me obrigarem a concluir que a estupidez humana nem no céu encontra o limite), pelo que lá me vi compelida a enfiar os tais três míseros bombons bolsos adentro. Já não ia a este médico há seis meses, das últimas vezes que fui a consulta tinha passado de 60 para 80 pacas (com a justificação de que "as ampolas estão cada vez mais caras"), mas como aquela tabela é um bocado à balda e quem determina o preço é a mulher dele, não sei se antes se depois de consultar o oráculo, resolvi levantar 100. Por isso, à saída questionei-a sobre qual o valor a pagar pela consulta, ela fez uma pausa para reflectir a fórmula matemática e as variáveis a considerar, e sai-se-me com esta, ao cabo de sei lá, três segundos de reflexão: "Sabe, as ampolas estão cada vez mais caras, a consulta aumentou um bocadinho". Eu com o porta-moedas cheio de notas azuis, preparada para deslargá-las, ouço, em conclusão: "São 60 euros". Paguei sem protestar, com os bolsos cheios de chocolates.