Isto passou-se com outra pessoa, que eu sou uma cabra insensível e não sou capaz de sentir coisas bonitas para além dos momentos em que me olho ao espelho. Só está na primeira pessoa, que é para facilitar o discurso.
Entro no quarto sem saber o que vou encontrar, com o coração a saltar pela boca de medo-medo, que é aquele medo igual ao que sentimos quando somos pequenos e nos perdemos da mãe. Eu perdia-me constantemente da minha mãe, e não percebia qual das duas era a distraída, se ela, que me perdia, tão pequena, em todos os lugares onde íamos juntas, e que eram muitos, e muitas vezes, ou se era eu, que ficava a saltar à macaca nos ladrilhos que inventava na rua e nas alcatifas dos armazéns, ou simplesmente a pasmar por ter tido uma grande ideia a meio do zero, e me perdia dela. Aquilo provocava-me um medo tão grande que passei a segui-la à cão por todo o lado, agarrada à saia dela, uma vez até me meti dentro do provador com ela, distraí-me a mirar-me ao espelho e, quando me virei, já a tinha perdido outra vez, foi tão trágico, dei o primeiro grito que dava sempre, "Mããããããe!" e depois sentei-me no banquinho a asfixiar de tantas lágrimas, a sentir-me outra vez órfã e abandonada, mas que raio, devia ver filmes da Disney a mais. Punha-me a chorar, sentidíssima, "Perdi a minha mãe...", e chorava sem gritos, toda sufocada, "Não sei da minha mãe...", porque considerava aquela situação profundamente irremediável. Não sei explicar como, a minha mãe nunca perdeu a outra, só me perdia a mim, o que me leva a crer que a estabanada devia ser eu. E hoje lá fui, atravessada pelo pânico de a perder, a ouvir aquele grito tão familiar mas já tão longínquo, "Mããããããe!", "Perdi a minha mãe...", e ouço-a, num fio de voz velhinhíssima, "A minha filha! A minha filha adorada! A minha filha mais bonita!", no exacto momento em que já só me apetecia chorar a orfandade que já sinto há anos.
Fiquei emocionada :(
ResponderEliminarStormy days are coming :-|
EliminarMãe há só uma. E é isso que as torna especiais. Mas se fossem mais do que uma, nunca ficaríamos sem mãe. E isso era muito bom. Nunca me perdi da minha mãe como acontecia com essa pessoa de quem falas. Mas ainda hoje é pela minha mãe que chamo quando me vejo em apertos.
ResponderEliminarEssa pessoa ainda hoje tem ataques de cada vez que perde um filho na Primark, por exemplo. Ficou-lhe a mania.
EliminarMas com duas mães poderíamos perder as duas na mesma, a vida às vezes é tão estúpida.