13/08/2022

Nunca fujas ao teu destino

Estava eu relativamente mal instalada no grupo do whatsapp da dança, no qual havia entrado apenas e tão-só para obter o nome de uma música — que adoro de paixão e é para aí a única coreografia que sei de cor sem erros, o que já faz de mim uma interesseira inescrupulosa —, onde me aborrecia com toda a solenidade, basicamente porque, sendo o mesmo constituído por dezenas de pessoas, as trocas de mensagens eram acerca de tudo menos do interesse comum, já não contando com os aniversários, em que era um dia inteiro de quadrinhos amorosos de parabéns, numa desordenada competição de quem é que conseguia o mais piroso, depois fiquei doente, abandonei as aulas e saí do grupo, um alívio sem precedentes, só comparável ao da satisfação de uma necessidade fisiológica premente, sete meses de paz e sossego, e depois voltei. Voltei, e voltei a dançar, e devo ter ficado tão excitada com essa volta que a minha vida deu, que pedi a uma das administradoras [olha a cagança] que me incluísse de novo no grupo, ela assim fez, e eu, sejamos honestos, aguentei-me lá… quatro dias. Desta vez, já não havia necessidade de alguém fazer anos, estava rigorosa, diária e definitivamente instituída a parolice no grupo, por conta não sei de quem, ou de quens — a pessoa entra, baila e sai, não conhece nomes, não associa caras, não nada, sabe apenas que há a alta, a gira, a que dança bem, a gorda, a antipática, e já sabe muito —, todos os dias gifs cheios de glitter a desejar um dia bom, bonecos a brilhar, corações a explodir de tanto amor, my eyes, my eyes, não posso desver tanta saloiada, então saí outra vez, desta feita para não mais voltar, o problema és tu, não sou eu, podes ficar com o carro, a casa, as jóias, os putos, mas nesta barraca de farturas não fico eu.



Estava eu descansada da minha vida, livre de gifs com ursinhos e outros bichos cheios de amor para me dar, quando, de repente, a mulher que podia ser minha mãe — que, relembro, deu um olímpico trambolhão e partiu não sei quantos ossos, ao nível do fémur e do pulso, mas, que eu tenha sido informada, nenhum no crânio — desata a mandar-me diariamente bonecada semelhante à anteriormente descrita, os bons dias, a frase lapidar, a lição de vida, as protecções divinas, tudo muito cheio de brilhantinhos e corações e sopeiradas assim. Vejo-me compelida a responder-lhe com um singelo porém assertivo coraçãozinho, em sinal de “gostei”, só para não a ofender, quando, efectivamente, “não gostei”, isto de ser uma pessoa educada é um fardo excessivamente pesado, que faz da pessoa uma conformada e hipócrita, quando a minha vontade era correr tudo ao coice, socorro, tirem-me deste pesadelinho!

Preciso de uma explicação do cosmos: porquê?