03/08/2022

Hoje ando em limpezas (e não são de Verão)

Fartei-me de páginas que andava a seguir, de mulheres com cancro, e hoje des-segui-as todas. Só faltou a Fernanda Serrano, que é um caso de recuperação, bonitíssima (ainda mais ao vivo do que em fotografias), e a quem outro dia descobri uma cicatriz na axila igual à minha, pelo que me senti menos desanimada com o assunto. De resto, foi tudo. É com algum remorso, mas também tranquilidade que confesso que nunca segui @ilovecancer, porque o nome da página me deixava demasiado apreensiva e incrédula. I hate cancer, want to kill it. Até a queridíssima Joana Cruz foi na cheia, zanguei-me com ela desde que cortou o cabelo, ainda ele estava curto. E uma outra, muito animada, sempre a rir muito e a achar um piadão às fases todas desta merda. No mesmo barco meti uma que foi mesmo mastectomizada e passa a vida a ralhar com a vida e os seguidores. Compreendo-a, também me apetece acabar com o mundo à dentada e à unhada, só não me apetece aturar as birras das outras, se nem as minhas aturo.
Outro dia falei com uma amiga que passou por um processo semelhante ao meu pouco tempo antes de mim, a quem o cabelo e todo o pêlo caíram até à lisura — ao contrário de mim, que mantive o meu pente um do início ao fim da quimioterapia, sem uma pelada, ou seja, não caía mas também não crescia —, e que começou a rapar quando ele começou a crescer porque não aguentava ver metade branco e metade escuro, “parecia uma porca malhada” (sic). Até tive vontade de lhe bater.
Todos os dias vou verificar se o meu cabelo já cresceu mais um milionésimo de milímetro. Há dias em que sim, há dias em que não. E esses são duros como o caminho de pedras pontiagudas, descalça, que tenho percorrido. Chamem-me fútil. Digam-me que isso não é o mais importante. Digam que “é só cabelo”. E que “cresce num instante” (um centímetro por mês, vai demorar até bater nos ombros, não?). Claro que sim, tendes razão. Mas eu quero o meu cabelo de volta. É a minha fuga? Pode ser, respondam os psis. Enquanto me entretenho com isso, não penso no cancro. Mas, de todas as dores por que tenho passado, esta é de longe a que me dói mais.