28/09/2018

Dois pesos, duas medidas

Vamos lá a ver se a gente se entende: eu não celebro a morte de ninguém, não tento explicar homicídios, recuso-me a chamar motivos às motivações de quem se move com o intuito de tirar a vida a outrem, etecetera. Só ainda não consegui perceber o motivo - aí sim, um motivo - de espanto e horror pelo facto de a morte do triatleta de Alenquer ter sido perpetrada pela mulher dele, ou a mando dela, com intervenção directa do amante. Amante, atenção. Porque os senhores que assassinam suas mulheres/ namoradas/ companheiras ou ex isso tudo, quando têm outra pessoa na equação, ela é "a namorada".
(Como a do CR, que já tem uma chusma de filhos dele, fora os que lhe aguenta provindos do laboratório, mas continuará a ser, para todo o sempre, "a namorada". Pá, eu sou de outros tempos.) Bom.
A mim, o que verdadeiramente me espanta, é a quantidade de mulheres que morrem às mãos dos seus carrascos maridos, namorados, companheiros ou ex isso tudo (ou ex nada disso, pois a eles basta-lhes querer ter uma mulher que, mesmo que, e por força disso, ela não lhes corresponda nesse querer, já merece a morte). Só no primeiro semestre deste ano, foram mais dezasseis, o que dá uma média de trinta e duas por ano, ou seja, praticamente uma a cada dez dias. Parece que isto não choca ninguém. Também parece que o facto de alguém ser triatleta o distingue e define. Eu não sei se as dezasseis que morreram até ao final de Junho eram tetratletas ou pentatletas, médicas, domésticas, ilusionistas ou apenas mães. Eram pessoas, e morreram às mãos e pela vontade de alguém que as considerou indignas de continuarem vivas, just because. Alguém que, na linguagem jornalística, tinha "os seus motivos". Como agora, a indigna (sem ironias) viúva (isso sim, uma ironia, alguém adquirir este específico estado civil por sua própria iniciativa) do homem estupidamente assassinado, que era triatleta.

10 comentários:

  1. Honestamente e sem querer desculpar ou atenuar os crimes dos maridos, namorados ou o que for, parecem situações diferentes. A frieza, o ocultar, o dar entrevistas, revela uma personalidade diferente e, talvez, mais condenável.
    Mas é só a minha opinião.
    E a gatinha? Está a recuperar bem?

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    1. E a premeditação, que piora todo o cenário. Mas pergunto-me se, como sabemos nalgumas daquelas situações de violência continuada, algumas que duram anos a fio, tudo o que leva ao homicídio não é também uma premeditação, um horror de frieza, uma impunidade criminosa, consciências tranquilas em crimes perpetrados diariiamente. E também me pergunto se esses senhores, em tendo oportunidade, não dariam as suas entrevistas. Em vez de dizerem “Não fui eu”, talvez dissessem “Teve o que merecia”. Ninguém é melhor que ninguém, infelizmente :/

      A gatinha melhorou, mas vai devagarinho. Perdeu 500 gr, está com 2,200 kg. E muito quietinha. Só tira os pontos todos na 2.ª feira, porque ontem tinha um a querer infectar. Tomou injecção e tudo. Pobrezinha...
      Obrigada, Ana

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    2. Custa muito ve-los doentes. As melhoras da gatinha.

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    3. Custa, estou mortificada. Acho que ela já nem me pode ver, eu sou a das “maldades”.
      Obrigada, Ana

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  2. Anónimo28/9/18

    As tuas palavras puseram-me a pensar. Tens razão claro, mas nós meros humanos não conseguimos passar sem julgar os outros. E as mulheres são as piores juízas e carrascas uma das outras.

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    1. É verdade que são, mas são-no para minudências relacionadas com a estética e a atitude. Quanto a estas questões maiores, quero crer que são, nem que seja um pouco, mais solidáris...

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  3. Para não falar que quando mencionamos da violência doméstica e homicídio, há sempre um homem que recorda um caso destes. Um...em... quantas centenas de mulheres, mesmo? Mas é igual claro, muito sentidos os homems.

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    1. Sabes que nunca me esqueço de ter lido há muitos anos um artigo sobre mulheres presas por homicídio, e de haver uma que tinha morto o companheiro de uma vida, que a açoitava violenta e diariamente (presa por cordas e correntes às traves do tecto!), e que estava, “simplesmente”, a morrer de saudades dele?
      Já agora, a população prisional feminina não chega a 10% da masculina, e isso tem um significado. Somos feitas de outra fibra...

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    2. Não conheço o caso, mas não me admiro... é tão triste.
      Fico possessa quando me queixo de alguma coisa e dos trabalhos a que nós mulheres nos damos diariamente para evitar problemas de abuso sexual e vem sempre um homem mansplaining que eles também sofrem tanto e têm que tomar precauções tb por causa dos assaltos e isto e aquilo.

      E o Trampas? Que a última boca é que tem muito medo pelos filhos dele que nunca se sabe alguma maluca os irá acusar de qq coisa indevida... este mundo está um perigo para estes rapazes novos.

      Arghhhh
      Este assunto deixa-me o sangue a ferver!

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    3. Mas sabes que esse assunto também me causa mixed feelings. Também tenho um filho, não sei se por isso. E não há dúvidas que os rapazes/homens sofrem igualmente de bullying, assédio, abordagens, violência. Se calhar por estarem mais desprevenidos, acabam por também ser vulneráveis. Já quanto à violência doméstica, praticada por parentes ou alguém com relações que se querem afectivas, é que é muito mais difícil encontrar casos do que é com a mulher como vítima. E não é só a vergonha social que explica esse desfasamento, é mesmo porque são em muito menor número. Por outro lado, a violência tem contornos tão finos, e todos sabemos de casos em que a mulher a pratica sistematicamente, designadamente a nível emocional ou psíquico, que fico sempre um bocado sem saber o que achar. A estatística diz tudo: regra geral, eles não morrem. (Pelo menos, não às mãos delas.)

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