Existe qualquer elemento na estação de Correios da área da minha residência — pode ser o ar que lá se respira, misto de cartão, electricidade e cabelos —, que me transforma num monstro. É raríssima a vez que lá vou, não por vergonha da cena anterior, mas por saber que me vou irritar, abrir as goelas e partir a loiça toda (não literalmente, já que ali praticamente nada é de porcelana). (Há uma mulher assim no Continente, mas essa é maluca.)
Um destes dias, quis o Cão que eu tivesse ido lá deixar um envelope do meu microscópico negócio on-line. Entrei, entreguei, paguei e sumi-me. Nem parecia eu. Passada uma semana, a destinatária avisou-me que a pequena encomenda ainda não chegara. Pedi-lhe que esperássemos mais uma semana, e assim fizemos. O pacote (olarilolé, olarilolé, bailar assim sabe tão bem) não chegou, cá me meti na chanata e ala para a estação. Lá chegada, verifico que tenho cerca de vinte pessoas à frente e aquele odor a Correios tomou conta do meu nariz, das minhas unhas, dos meus dentes, dos meus cotovelos, mãos e pés. Chega uma chica, pergunta a Paula, aquela funcionária com quem já me alterquei milhares de biliões de vezes, se pode fazer só uma perguntinha, e fica lá. Ao cabo de cinco minutos, avisei a que estava ao meu lado, já divertidíssima com os meus comentários, que ia largar a bomboca, para depois ficar a ver o circo a arder. Perguntei então de que tamanho era a pergunta da freguesa, tão demorada, que me respondeu que tinha ali hora marcada. Ia falecendo a rir com a resposta absurda da criatura, mas o resto do povo ficou a pontos de linchar a mulher, que nem oportunidade de argumentar com ela me deu. Cambada de chatos, nunca dizem nada, tem sempre que ser aqui a pioneira que toma as rédeas de tudo (eu nessa casa, tudo eu).
A funcionária que me atendeu disse que eu podia escrever uma queixa no portal lá deles.
Para me responderem o mesmo que a senhora me está a dizer?
Sim.
Ah, penso que vou declinar.
Hoje a que me fez a encomenda comunicou-me que a recebeu, vinte e três dias depois da expedição. Esteve sem saber da chave da caixa do correio uma semana e meia (ou terão sido duas e meia?). Apetece-me fazer agressivo uso das minhas unhas, dos meus dentes, dos meus cotovelos, mãos e pés.