Começámos o programa um pouco por curiosidade e interesse em informação acerca do que nos traria a vida pós-cancro, éramos todas desconhecidas, unidas por um laço triste como são os da pouca sorte, iguais àqueles que domam à força um cavalo selvagem.
Com o passar das semanas, algumas desistiram por motivos lá delas, outras mantivemo-nos intactas, procurando, através do exercício físico, respostas para os nossos corpos retalhados e as nossas cabeças quebradas. O ambiente foi sempre cordial e, às vezes, alegre.
Mas ontem houve abraços e houve lágrimas. A uma de nós apareceu “uma coisa” num pulmão. Todas vivemos com esses dois monstros a ensombrarem-nos os dias e as noites, sejam de sol, de chuva ou de lua cheia: os pulmões e o cérebro, para onde dispara, quando prime o gatilho, o que tivemos, umas há três anos, outras há cinco, cada caso é um caso, cada organismo é um organismo. Temos estes chavões gravados com ferro em brasa nas nossas almas, agarramo-nos a eles nas horas mais aflitas e também nas mais aliviadas.
Dei comigo a dizer-lhe: “Deus é grande, não há-de permitir. O pior já nós passámos”, logo eu, que só acredito num Ser maior, que tudo pode e nem sempre nos faz a vontade, mas não me levem aos padres, que eu não fui feita para aqueles rituais sem nexo nem lógica.
Deus é grande, não há-de permitir. O pior já nós passámos.