18/09/2020

Milu, a escrava do silêncio

Nunca tinha tido - ou sequer ouvido falar de - uma gata que não mia. Em quatro meses de vida, jamais o fez, donde se conclui que é muda. Comunicada esta espécie de preocupação - que, na verdade, constitui uma doce tranquilidade, uma casa onde o animal de estimação não emite qualquer som - à veterinária, recebi de volta um encolher de ombros, e a resposta "Normalmente, são as mães que ensinam os gatinhos a miar". Ora, esta mãe não ensinou a sua filha a miar, a abandónica. O máximo de sons que lhe ouvimos até hoje foi "iiiii" e "aaaa", muito baixinho. Não imagino como serão os cios desta m(i)udinha.

Por outro lado, aquela mãe desnaturada também não deve ter amamentado como deve ser a sua cria, pois, para além de nos ter chegado muito magrinha, come tudo o que vê à frente (ração da Molly incluída, que é para gato adulto esterilizado): todo e qualquer alimento humano lhe serve de refeição, desde sopa a frango, passando por carne picada, legumes cozidos (beterraba incluída!), massas, todo e qualquer peixe - ou não fosse um gato (?) -, fruta, queijo, fiambre, e o top-mais-que-tudo de todos, o meu iogurte, que é só a coisa mais amarga de sempre (embora eu seja considerada, cá no lar, "a pessoa sem paladar e que não distingue as cores", portanto, eu posso). Quanto a Milu, tem que ser fechada numa divisão da casa (que não seja a cozinha) à hora das nossas refeições, pois, caso contrário, salta para a mesa e agride-nos os pratos, recusando a própria comida - que é própria, passe o pleonasmo -, com aquele ar de Maria de Lurdes, "Estes querem que eu coma comida de gato porquê? Comam-na eles!". Vá que não nos agride a nós (se calhar, por enquanto). 

Tem com a Molly a mais surpreendente e quase pacífica relação que algum dia pudéssemos imaginar que teria. Meteu na cabeça que a cauda da outra é um brinquedo/ presa/ companhia, algo que urge conquistar, pelo que dedica horas a segui-la, a espreitar, a escolher o melhor ângulo, a saltar na direcção do seu objectivo, felizmente para as duas até hoje por atingir. Gradualmente, a Molly tem vindo a desistir de lhe rosnar e nunca a perseguiu para a agredir. O máximo que fez foi dar-lhe uma sacudidela com uma pata, mas isso, convenhamos, só lhe faz bem, visto que, efectivamente, a mãe não lhe deu a educação mais básica, como vimos acima.


Ainda acabam ´migas gatas. (Hah, piada alentejana!)


De resto, Miluzinha foi a melhor coisa que nos aconteceu em 2020, logo a seguir ao voo que trouxe uma das minhas crianças de um Erasmus que não chegou a ser - mas que ainda durou quatro meses -, numa altura em que não havia aviões no ar, de todo. (Houve aquele, apanhado a muitos quilómetros do ponto de partida, após escalas de três comboios. Aleluia, irmãos!)

Não tenho muito mais para dizer, a não ser que apareci na televisão outro dia, mas é assunto que guardo para quando for seguro falar nele. Posso apenas adiantar que, como é óbvio, foi um momento de grande intelectualidade e beleza. 

Para qualquer dia, uma lição de Português bonito, que há muito não forneço aqui. Mas andam-se-me a trocar as órbitas com coisas que vejo publicadas un peut partout, designadamente ao nível da pontuação dentro e fora dos parêntesis e das aspas, numa arbitrariedade a raiar o chavascal, que já não se aguenta sem ter uma apoplexia ou, em alternativa mais saudável, partir a loiça toda. 

Pronto, adeus. E miau.


4 comentários:

  1. Como não sou boa em pontuação e não quero provocar uma apoplexia a ninguém, limito-me a dizer o seguinte:
    1-O meu gato, Pickwick também mia muito pouco;
    2-O Noddy, pelo contrário, nunca está calado;
    3-O Pickwick é muito selectivo com a comida;
    4-O Noddy gosta de experimentar tudo,sopa, peixe, pataniscas, carne, bolachas e adora broas de Natal (?)
    Donde se conclui que:
    Cada gato é um gato.
    :)

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    1. Não encontrei problemas na tua pontuação... :)
      Esta gatinha não mia pouco, Ana, simplesmente não mia! Pronto, deve compensar essa lacuna com aquele apetite/ curiosidade pela comida não própria.
      Vou na quarta gata, ainda não tive duas iguais :)

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  2. Em Julho a Minnie caiu-nos em nossa casa literalmente. Atirou-se de um muro. Vinha pele e osso, com um maxilar partido e quase a morrer porque já nem sequer conseguia beber nada. Num estado deplorável. Felizmente com muita paciência recuperou em pleno. A Minnie mia, mas muito baixinho. Já tive muitos gatos e nunca tive uma que miasse tão baixinho. E também gosta muito da nossa comida, apesar de que eu nunca lhe dou comida da nossa, penso que deve ter sido de andar na rua, já a outra gata que temos só gosta de ração. No início a Nikita, a nossa outra gata, bufava-lhe muito e fugia. Mas ela não queria saber, andava sempre atrás dela. Temerária. Até que de um dia para o outro, tudo mudou. Agora são inseparáveis. A Nikita trata-a como uma filha. É mesmo espectacular. (Se tiver erros de pontuação é fechar os olhinhos) :)

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    1. Pois, a fractura do maxilar é típica dos gatos, quando caem de alturas consideráveis. Coitadinha, mas teve um desfecho feliz 🙂
      Acho que estas duas vão também ser grandes amigas. Se forem espertas, é o que acontece. Mas não se agridem, já convivem pacificamente no mesmo espaço, ainda que pequeno (sofá, por exemplo). Já só vejo bufadelas da Molly quando a pequena tenta brincar com a cauda dela (não desiste!). Mas sem perseguições, dentadas, unhadas, que eram o meu medo.
      (O pessoal vai sempre na esparrela do ponto fora do parêntesis ou das aspas, em frases isoladas. A tua pontuação está impec! 😊)

      (Tipo isto).
      Neeeeerves.

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