Entrou uma mosca, há dois dias, cá em casa. Veio pela porta da varanda, que deve ser aquela que é conhecida como a porta do cavalo — embora fosse difícil metermos por ali um jerico, já que o lar nos fica a dois pisos do solo —, por contraposição à porta de quem cá mora, das visitas e dos convidados, que, conforme se sabe, não são exactamente a mesma coisa.
De início, ficámos incomodados com a chegada de mais um habitante, num casebre de cimento onde dormem e se alimentam seis bocas, dois focinhos e dois bicos; tementes, não fosse a bicha tirar-nos migalha, ou, pior do que isso, inquinar as nossas. Vai daí, a doutrina e a prática dividiram-se, e formou-se uma facção que defendia a morte (ó a contradição implícita na expressão), e outra, por mim encabeçada, a do Movimento Pro-vida da Mosca.
Foram quarenta e oito horas de muita luta (os Anti-fly foram apanhados, por diversas vezes, em tentativas de silenciamento da bicha, o que nos obrigava a nós, Pro, a manietá-los, e, simultaneamente, a defendê-la, não só com unhas e dentes, mas com o corpo todo, designadamente agitando os braços, para que ela, embora assustada, de coraçãozito em palpitações, fugisse a voar da zona de perigo afora), de muito uso de truques caseiros para a atrair para uma janela aberta (luzes apagadas, luz acesa fora de casa), e de tentativas para que saísse pelo mesmo buraco por onde entrou, como os bebés. Mas não houve nada que a demovesse de nos pairar, qual fantasma, nas cabeças, nas paredes e nos móveis, na paciência das gatas e na gaiola dos passarinhos.
Ao fim de vinte e quatro horas, cabecilha do meu movimento, instituí que a posição mais sensata seria a de aceitar a permanência do animal cá no lar, nos mesmos termos e com os mesmos direitos que qualquer dos restantes dez habitantes, o que foi aplaudido pelos dois — e únicos — apoiantes da minha seita (nesta casa, estamos sempre num empate doloroso e inconveniente, um três para três que nem no basquete é tão irmanado, e não contamos nós com as gatas e os passarinhos — que funcionam como a percentagem abstencionista, absolutamente necessária num quorum que se preze —, embora estejamos convencidos que, a sufragarem, a igualdade ainda seria mais esmagadora, pois são mais dois pares e haja quem invente uma maioria, num plenário composto por pares, e depois falamos). E, assim, foi-lhe atribuído um nome suficientemente onomatopeico, com vista a que ela, pelo menos, nos entendesse quando a chamássemos (para vir para a mesa, por exemplo): Ziza.
Só que hoje...
Hoje é dia de festa, há bolo, o bolo deu trabalho a fazer e a Ziza não o ia largar, feita lambona, a querer ser a primeira a esparramar-se nele, ignorando o facto de não ser o aniversário dela. Além disso, ficou claro que não seria capaz de entoar a melodia dos parabéns, para mais do que zzz-zzz. Pressionada por mais um ataque da facção Anti, abri, pela enésima vez, a janela da cozinha e, como nas aldeias, peguei num trapo e enxotei-a, até ela sair. E Ziza, a minha mosca, voou, para longe do meu bolo que não é meu.
Assim, saiu, por um buraco diferente daquele por onde entrou — como os bebés de cesariana. Faz todo o sentido, no dia de hoje.
E tudo o que consigo escrever é:
ResponderEliminarDá-me um bocadinhooo!
Serás lambona, como Ziza, tu, Pandy?
EliminarVou só preparar a caixinha de tuperware, depois amando.
Depois de ver a foto, não me admira! Se eu fosse a mosca tb faria o mesmo!
ResponderEliminar(Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo, Bolo!!!)
(Vê lá se mandas uma fatia, nem que seja virtual!)
:)
Vendo bem, também eu.
Eliminar(Ainda não o abrimos, mas eu já salivei tanto que espero que as papilas não estejam demasiado encharcadas.)
(Já tenho ali umas caixinhas virtuais, para os envios :))
Guarda-me 2 fatias. Sim, 2, porque 1 nunca chega :P
ResponderEliminarFazia-te magro, Jé! :P
EliminarTambém quero!
ResponderEliminarOlha outro lambão. Sai mais uma caixinha!
EliminarO post é enorme, mas felizmente, li esta frase: "ssim, saiu, por um buraco diferente daquele por onde entrou — como os bebés de cesariana."
ResponderEliminar...e já valeu a pena. :p :p :p
Leste-o todo, então! :P
EliminarE deixaste escapar ou ainda para que saísse pelo mesmo buraco por onde entrou, como os bebés?
:P
Não... só li esta frase. :D
Eliminar(as pessoas vão pensar que estou a brincar, mas pronto... assim custa menos...)
Ó pá, sou tão subtil... :D
EliminarQuero lá saber da mosca... Bolooooooooooooo!!!
ResponderEliminar(e beijinhos à piquena. Da parte do Mg.)
Repara: poupei mais uma vida. Isso não te comove?
Eliminar(Mando-te uma caixinha com uma fatia generosa, por aquele mensageiro, lembras-te?)
(serão entregues. Eu digo a fonte e tudo.)
Absolutamente nada. Eu é mais bolos.
Eliminar(aquele que se perdeu pelo caminho? Perfeitamente...)
(e nada de ficares com alguns pra ti. Hoje é só pra menina.)
Bruto, ai bruto!
Eliminar(esse mesmo. Talvez desta vez me meta a cavalo, no lugar dele.)
(unzinho, só unzinho...!?)