A minha rua é pequenina, tem apenas três prédios — parece aquela história da palavra pequena, a maior que o mundo tem. E é um beco, também. Não sei por que não se chama Beco-não-sei-quê, em vez de Rua-não-sei-quantas. Beco-da-Mãe, por exemplo.
Na ponta oposta, cruza com outra rua, que também é uma rua pacata. Aliás, o meu bairro parece uma aldeia, com todas as vantagens de uma aldeia (toda a gente se conhece, e os meus vizinhos dão-me legumes) e nenhuma desvantagem (ninguém se mete na vida de ninguém — avalio eu, por mim), mas encaixado numa cidade, com todas as vantagens de uma cidade (acessos fáceis, tudo à mão) e nenhuma desvantagem (esta foi mais para compor o texto, porque, na verdade, as emissões de CO2 são as mesmas, e haverá chumbo nos nossos pulmões, sem que para isso necessitemos de os balear).
Na ponta oposta, cruza com outra rua, que também é uma rua pacata. Aliás, o meu bairro parece uma aldeia, com todas as vantagens de uma aldeia (toda a gente se conhece, e os meus vizinhos dão-me legumes) e nenhuma desvantagem (ninguém se mete na vida de ninguém — avalio eu, por mim), mas encaixado numa cidade, com todas as vantagens de uma cidade (acessos fáceis, tudo à mão) e nenhuma desvantagem (esta foi mais para compor o texto, porque, na verdade, as emissões de CO2 são as mesmas, e haverá chumbo nos nossos pulmões, sem que para isso necessitemos de os balear).
A não ser este cruzamento, sobre — praticamente — o qual moro.
Ele são ciclistas na ciclovia.
Ele são pessoas a correr pela pista (é a mesma, mas uma pessoa tem a tendência para a distinguir em função dos utilizadores).
Ele são crianças que brotam como flores por todo o lado — é que, vá, num percurso de cem metros, temos duas creches, um jardim de infância e uma básica de primeiro ciclo. Dá-se o caos, quando os pais vêm trazer ou buscar. E brotam mais crianças dos carros que vêm às creches (os irmãos mais velhos). Sabem aquelas debandadas de fim de tarde, quando os pardais se juntam todos na mesma árvore? É assim.
Ele são carrinhos de bebés. Com bebés lá dentro.
Ele são senhoras muito barrigudas. E que não parecem ter abusado dos fritos.
Ele são muitos cães à solta da trela — para poderem passear à cão, e decidir capazmente onde depositar a feze (normalmente, no meu passeio).
Ele também aparecem gatos. Debaixo dos carros, ou a voar à frente de um cão.
Isto faz com que, quando circulo numa rua em que, como em todas, salvo indicação em contrário, até posso ir a 50 km/h, nestas duas que se cruzam aqui debaixo do meu nariz, tenho que ir a 10 à hora, a olhar para todos os lados — com stretch do pescoço, bendito Pilates —, porque o mínimo que me pode acontecer é passar por cima de um pombo. E isso seria absolutamente traumático (para ele, mas também para mim, que, conforme sabeis, andei a bater mal uns dias por ter morto — e nem sei se bem morto — um gato).
Ainda ontem salvei uma lesma de morrer no meu lava-louças. É a segunda lesma que salvo esta semana. Costumo pegar num bocadinho de folha de alface, tipo tapete do Aladino, e embarco a lesma janela abaixo. É um invertebrado, não vai fracturar a coluna. Mas fico preocupada se o tapete voador vai dar ao cruzamento onde toda a vida deste bairro se processa, com a minha lesminha lá em cima, e ela fica esmagada debaixo de um rodado. Invertebrado, mas não tanto.
Isso diz muito sobre mim?
Diz, pelo menos, que eu ando a comprar alfaces com lesmas.
Pensei que só eu é que salvava lagartas, lesmas e caracóis.
ResponderEliminarMas eu tenho outro método, pego-lhes, ou directamente ou através do recurso a uma folha de alface ou mesmo uma colher , vou ao terraço e atiro-os para o jardim da casa ao lado, que é uma farmácia...
Se alguma coisa correr mal, sempre estarão melhor
Eu costumo fazer pontaria para uns vasos grandes que há na entrada do meu prédio. Para as deixar na relva, teria que descer à rua, não vou tão longe :)
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