03/09/2015

única

Morre uma família inteira, quando morre uma filha única.  O pai já não é pai de alguém, a mãe deixa de ser mãe. Desnascem-se.
Não haverá mulher, não haverá netos, não haverá amanhã.
Morre o namorado, de coração esmagado, e, por isso, deixa de ser namorado, morrem os amigos, naquele bocado enorme em que são amigos daquela única pessoa única. 
Fica quem fica, a flutuar num oceano escuro, de noite, gelado, à chuva, nas ondas mais altas, tenebrosas, nenhuma tábua de salvação. Não há nada a o que se agarrar.
E depois, fica o nunca mais — a voz clara e límpida da infância e da juventude, a cantar Mãe. Pai. Duas palavras surdas para sempre, de três letrinhas apenas, subitamente as menores que o mundo tem. Nunca outras vozes a entoar avô, avó. 
Morrem pai, mãe, filhos que são netos, morre uma árvore inteira, até à sétima geração.
Mas estas não morrem de pé.


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