10/02/2016

Segunda circular, minha vida

A segunda circular foi acabada de construir em 1961, e era assim:

Foto daqui
Não sei explicar o fascínio que a imagem do burrico exerce sobre mim, num local que conheço de uma forma tão pejorativamente cosmopolita.

A Câmara de Lisboa tem um projecto de arborização para a segunda circular, com o mérito de diminuir os índices de poluição sonora e atmosférica, com o desmérito de que cheira a alcavalas por todo o lado, mas isso também sou eu, que faço leituras transversas projecto + dinheiro/erário = buraco financeiro, facturado directamente ao interior dos bolsos do pobre tributado. 
O problema do projecto, aparentemente, está na possibilidade de a passarada colidir com os aviões e, assim, provocar acidentes. Diz a Câmara que isso não pode ser, porque Em caso de colisão, o peso da ave e a velocidade do avião são determinantes para a força do impacto, que (convém sublinhar) não é suficiente para provocar a queda do aparelho. Eu disso não percebo nada, mas acho que os senhores do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves estão a falar de reactores e o povo da CML está a falar de pardais e rebéubéu, e a fazer do dito gabinete um antro de tolinhos, que acredita que um passareco é capaz de fazer cair um jumbo ou um airbus, ou mesmo que uma águia pode amandar abaixo um teco-teco. 


Foto daqui
A segunda circular é a estrada da minha vida, onde passo os meus dias, por onde correm todos os meus percursos. É lá que me despejo e me despojo, onde desalinho e depois realinho, por lá passam quase todas as minhas emoções, pois é ali que estou eu e eu, sozinhas as várias, cantando alto, reclamando com os condutores, rindo da parva da vida, até chorando porque chove e molha mesmo.
A segunda circular leva-me à minha mãe — é, por isso, uma estrada que, apesar de sinuosa e mal rasgada (com saídas e entradas distanciadas muito aquém dos mínimos de segurança) —, é, para mim, uma espécie de estrada do amor. De resto, a cumprir-se o projecto na justa medida do que a Câmara de Lisboa pretende, a segunda circular irá assemelhar-se a uma das estradas do nosso Alentejo —, o que, por último, mas não em último, me faz todo o sentido, já que, também elas, de uma maneira ou de outra, me levam à minha mãe — e a mim.


Foto daqui

18 comentários:

  1. Anónimo10/2/16

    Ficarei fã da proposta da CML se, como propôs a sua Assembleia Municipal, em vez de árvores forem plantados arbustos.
    E se em vez de pássaros, passarinhos, passarucos, melros, tentilhões e cucos, apenas por ali voassem ... pirilampos. Não fariam mal aos teco-tecos e poupava-se energia.
    Que grande ideia acabei de parir! :) :)

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    1. Eu também não auguro bons ventos para as árvores ali plantadas, dado os índices de poluição que ali se concentram.
      A questão da passarada é que vêm atraídos pelo arvoredo. Mas não serão águias nem gaivotas, a enfiarem-se reactores adentro, digo eu...
      Manda mail para a AM :)

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    1. Quanta mais vegetação tiver, mais viva ficará.

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  3. Anónimo10/2/16

    E a diminuição de faixas? E a drástica redução de saídas? E já agora, qual é a alternativa, escoar o transito para a Calçada de Carriche? Esta ideia consegue ser ainda melhor que a reorganização da Avenida da Liberdade...

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    1. A diminuição das saídas não me choca, porque não faz qualquer sentido, em termos de segurança, uma saída de duzentos em duzentos metros (Alvalade, Campo Grande e Telheiras, por exemplo), com entradas cinquenta metros à frente. Algumas, como as duas (saídas) da Estrada da Luz, distam cem metros, ou menos, uma da outra. A acrescer à existência de paragens de autocarro, uma bomba de gasolina, etc., aquele troço entre Alvalade e Benfica, é, no mínimo, uma piada.
      Quanto à redução de faixas, será péssimo. Se o trânsito já não escoa em nenhum dos sentidos, de manhã e ao fim da tarde, com menos duas das seis, mais vale voltarmos ao burrico, na verdade.
      Não sei se compararia a Av. Liberdade com este projecto. Na Av. Liberdade houve uma troca de direcção de faixas inteiras, de nascente para poente e vice versa, lado a lado com faixas de sentido oposto, já para não falar dos acessos do Marquês para a avenida, aquilo é o caos organizado, que só entende a cabeça iluminada que o desenhou.

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    1. António, muito obrigada pelo seu comentário. O link que deixa, que remete para um artigo de estudo seu (excelente, já agora), é um enorme contributo para esta questão da requalificação da segunda circular - sim ou não?
      Depois do que li, continuo a achar que é muito bonito e romântico ter uma via de cintura numa cidade cheia de arvoredo, mas que não é a solução para o pesadelo de trânsito (congestionado) que ela representa, isso não é.

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    2. O estudo da Câmara, pelo menos o original, foi só photoshopar árvores para cima. Nem se deram ao luxo de mudar as placas, que parece que vão ficar na mesma, como se pode ver nas imagens do fundo deste artigo inicial que fizemos:
      http://www.pouparmelhor.com/duvidas/segunda-circular/

      A proposta agora esta um pouco melhor, mas continua a ser lastimável para os lisboetas, os que trabalhamos em Lisboa, e os que visitam a cidade...

      A. Sousa
      PouparMelhor.com

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    3. A verdade é que a segunda circular foi construída na época das carroças, como se vê na primeira imagem que eu coloquei no post. A cidade cresceu, o parque automóvel multiplicou por cem, e as alternativas aos grandes acessos a e de Lisboa nunca se fizeram. Cada Câmara que é eleita faz uma grande obra, no sentido de dimensão e projecção estética, mas sem quaisquer estudos prévios ou considerações de impacto. Sabe o que me ficou no olho, nesta questão, desde a primeira vez que ouvi falar nela? A expressão "dez milhões". Mais nada. O resto é tudo circo, com as possíveis consequências que dele podem advir.
      Aquela ponte pedo-ciclável de que fala neste outro artigo, foi mais outra desgraça para todos os lisboetas e visitantes: uma "construção de Lego", que levou, no mínimo, seis meses de obra e congestionamentos. Actualmente, serve também para o trânsito de motas de entrega de pizzas, à vista de toda a gente e, eventualmente, das câmaras de radar que, se não existem, deveriam existir naquele local.

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    4. Passam lá motas de entrega de pizzas por cima da ponte pedo-ciclável? Não há ninguém que filme e ponha no Youtube? LOL

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    5. Passam pois!
      Há eu, um destes dias, com jeitinho e paciência :)

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  5. Carlos Moura, no momento em que procurei publicar o seu comentário, e porque o fiz através do smartphone, carreguei, sem querer, em eliminar. O que me vale é que tenho comentários moderados, pelo que posso copiá-lo para aqui. Peço desculpas pelo mau jeito, que foi totalmente sem intenção.

    Aqui fica ele:

    Carlos Moura deixou um novo comentário na sua mensagem "Segunda circular, minha vida":

    Desculpem-me a ignorância, mas em que parte do projecto é que está escrito que há redução do número de faixas? É que eu não encontrei nada disso.... Preocupa-me mais é não haver respostas alternativas para quem traz o carro para Lisboa por não ter outra possibilidade... É que sem bons transportes não há projecto que valha à redução do trânsito...

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    1. A redução das duas faixas, uma em cada sentido, não consta da divulgação do projecto, mas já não é a primeira vez que ouço falar nela. Veja aqui, por exemplo, no ponto 9 ("Ao nível das soluções de traçado e perfil"). Penso que tem a ver com a largura pretendida do novo separador central.
      Entretanto, as notícias mais recentes dão conta exactamente do inverso: http://expresso.sapo.pt/politica/2016-02-10-E-no-final-do-debate-sobre-a-requalificacao-na-2-Circular-as-criticas-nao-foram-sobre-a-2-Circular

      E sim, concordo que Lisboa tem um problema endémico e irresolúvel de trânsito, pelo que qualquer solução deste tipo é mera maquilhagem.

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  6. Teoricamente é tudo muito bonito. Mas só faz sentido fazer isto se houver alternativas de circulação.

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    1. Es verdad. Pero que no las hay...
      (Olha, deu-me as bruxas) :P

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  7. Txiii... que diferença :D

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    1. Mais a inaugural da actual do que a actual da projectada, não achas? :)

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