No momento em que chego, só de um relance — que dura, eu sei, décimos de segundo —, é a roupa que me diz se foi escolhida por um homem ou por uma mulher. Não é um pormenor que tenha alguma importância, todos são enfermeiros e acho-a sempre bonita. Está tão magrinha, passou de magra a mais magra e fica-lhe bem, tão elegante, sentada na poltrona, iluminada só de nos ver, acho mesmo que só nos vê às duas e a mais ninguém, não porque lhe falhe a vista — porque também falha —, mas porque só tem olhos para nós — literalmente.
Encontro-a, umas vezes, de bege e castanho, outras vezes de camisola azul, calças pretas e casaquinho encarnado — cada peça de sua cor, sinal de que quem escolheu a indumentária, nesse dia, foi um deles. Sentimo-la bem entregue, risonha e animada, apesar de mergulhada num silêncio que nos tolhe sem remédio qualquer assunto e possibilidade de diálogo. Enquanto lhe observo as mãos, verificando se é dia de cuidá-las, vejo-a a preocupar-se com o cabelo, Agora está com um tamanho bom, não achas? Chamo a cabeleireira daqui a uma semana ou duas. Tenho que comprar um champô especial para o manter bonito.
Já uma vez escrevi que ser filha é ser mãe ao contrário, e é: uma pessoa vive no pânico da perda, sobressalta-se com as zangas, esmorece nas tristezas e exulta pelos sucessos. Mais tarde — e não mais cedo —, cuida e preocupa-se, chora as falhas, celebra as permanências. Nessa altura, também as mães passam a ser filhas, também elas filhas ao contrário.
Encontro-a, umas vezes, de bege e castanho, outras vezes de camisola azul, calças pretas e casaquinho encarnado — cada peça de sua cor, sinal de que quem escolheu a indumentária, nesse dia, foi um deles. Sentimo-la bem entregue, risonha e animada, apesar de mergulhada num silêncio que nos tolhe sem remédio qualquer assunto e possibilidade de diálogo. Enquanto lhe observo as mãos, verificando se é dia de cuidá-las, vejo-a a preocupar-se com o cabelo, Agora está com um tamanho bom, não achas? Chamo a cabeleireira daqui a uma semana ou duas. Tenho que comprar um champô especial para o manter bonito.
Já uma vez escrevi que ser filha é ser mãe ao contrário, e é: uma pessoa vive no pânico da perda, sobressalta-se com as zangas, esmorece nas tristezas e exulta pelos sucessos. Mais tarde — e não mais cedo —, cuida e preocupa-se, chora as falhas, celebra as permanências. Nessa altura, também as mães passam a ser filhas, também elas filhas ao contrário.
Seguindo esta mesma lógica, uma vez a mãe tornada filha, e se ser filha é ser mãe ao contrário, então a mãe volta a ser mãe, num eterno regresso, ou retrocesso, na entrega e na pertença.
Não sei qual é o que me calha a mim, de todas as vezes que nos vemos. Sou mãe-mãe uns dias, mãe-filha outros dias, filha-mãe ou filha-filha, exercendo quatro papeis, de quatro estados de alma que, tendo tudo para ser opostos, em tudo são semelhantes, por se reconduzirem a um único sentimento — único.
Não sei qual é o que me calha a mim, de todas as vezes que nos vemos. Sou mãe-mãe uns dias, mãe-filha outros dias, filha-mãe ou filha-filha, exercendo quatro papeis, de quatro estados de alma que, tendo tudo para ser opostos, em tudo são semelhantes, por se reconduzirem a um único sentimento — único.
Usaste as cebolas de novo! :))
ResponderEliminarÉ um amor sem limite esse que descreves :)
Um beijo
Esqueço-me que há pessoas sensíveis a lerem o que eu escrevo :)
EliminarÉ sim :)
Beijos, Imp