07/10/2015

Numa escala de zero a dez, quão estranho é o teu gato? # 5

A minha Mia, tão comum europeu quanto a Mel, todos os dias demarca que as semelhanças entre uma e outra se ficam por aí: são ambas gatas e rafeiras. A Mia tem mais dois anos, mas é mais pequena e magra. E tem um péssimo feitio. É desconfiada, assustadiça e move-se na sombra. A postura dela nunca é de tranquilidade — nem quando dorme —, de alegria ou de desejo de contactos humanos. Também odeia a Mel, para além de todas as coisas e pessoas. Ou melhor, abre uma pequena excepção para pequena Miss Mimi. E é tudo. Qualquer pessoa que frequente cá o lar, tem que se manter afastado da tigra preta, no mínimo, um metro — começa bufando, depois assanhando-se, e é ter oportunidade, que saem unhada ou dentada frescas, certas e prontas. Eu, que nunca tinha sido mordida por um cão, já levei uma dentada da bicha, na perna, que deu direito a uma cicatriz que durou dois anos. 
Às vezes, a agressividade da Mia vem mesmo a propósito, apesar de eu perceber que é ela quem não está bem. Uma vez deu uma unhada no mariconso do administrador do condomínio, andava ele a pavonear a anca na minha sala, a dar palpites sobre a disposição das divisões. Apareceu aqui com a desculpa de acompanhar os rapazes que vinham arranjar a campainha, o empecilho. Um deles percebia de gatos e disse-me aquilo que eu já sabia: que a minha Mia tem pêlo de persa. E tem, parece que pôs uma estola de arminho. Tão bonita. E tão má. Coitadinha.
Fui buscá-la à quinta onde nasceu com três semanas de vida. Foi muito estúpido da minha parte ter insistido em trazê-la da mãe com tão pouco tempo. Nunca mais faço uma coisa assim, prometo. Foi um egoísmo muito grande, que eu vou pagar com uma culpa eterna. A mim, souberam-me bem os primeiros dias dela em casa: dava-lhe biberon de duas em duas horas, ou talvez menos, noite incluída. Parecia que tinha tido um bebé. Depois deitava-a numa cama pequenina, de lado (que deve ser a pior posição para se deitar um gato recém-nascido, mas era a prática com crianças e o terror da morte súbita que me faziam fazer aquilo), e ela ficava, tranquila e consolada. 


Tem seis anos, já foi esterilizada há quatro anos e continua a fazer demarcações de território que, neste momento, são diárias. Uma vez, a funcionária da vet disse-me que a maior parte das pessoas que ela conhece, com um gato assim em casa, já o tinham posto à estrada.
A Mia sofre de ansiedade. Para além de se tornar incómoda com as demarcações, de ser agressiva com tudo o que vê à frente, de ter ataques de loucura, a correr por cima dos móveis até que lhe passa o trotil, pouco come, pouco bebe, pouco vai à areia. Sente-se mal na sua pele — no seu pêlo lindo — e no seu ambiente.
Há dias em que eu a entendo tão bem. Só não tenho uma gola de arminho, nem a mim me é permitido correr em cima dos móveis. 



18 comentários:

  1. Anónimo7/10/15

    Ficas desde já a saber que não há gatos rafeiros, só cães!

    De nada!

    :)

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  2. As gatas marcam território?
    Mas só eu que tenho gatos normais?
    Só eu é que dou lambadas aos meus quando se esticam?
    E só os meus é que atinam quando apanham?
    Dúvidas logo pela fresca, que bom.

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    1. Eu também não sabia. E até achei que isto passava com a esterilização. Esta gata não está nos anais, se é que me entendes.
      Só tu tens gatos normais. Era eu dar um tabefe a esta e ficava sem um braço.
      Dúvidas sim, mas que sejam cor-de-rosa. Para as azuis estou cá eu.

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  3. Vou tentar fazer um bonequinho com cara chocada:

    :O

    Sem um braço?
    E a tua gatinha andaria sem uma patinha, pergunto?

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    1. A mim cheira-me que me deram leão por gato.
      Sem um dos membrinhos? Eu sou lá capaz de lhes dar com o trapo, quanto mais...
      Olha, cada um tem o que merece!

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  4. Socorro, eliminei um comentário sem querer!
    (chico-smart é demasiado sensível ao toque)
    Vale-me o mail e a moderação de comentários...

    Bels deixou um novo comentário na sua mensagem "Numa escala de zero a dez, quão estranho é o teu g...":

    Tens que ver os vídeos do Jackson Galaxy - "My cat from hell".
    Ele dá umas sugestões interessantes para animais "difíceis" :-)
    Boa sorte!

    Sorry, Bels :)

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    1. Vou ver. Juro, prometo. Estou farta de meter tudo na máquina com litradas de vinagre.
      Obrigada!

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  5. Pelo menos teve a sorte de ter uma dona como tu que tem paciência para esses ataques todos ;)

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    1. Pois, coitadinha. Roubei-a à mãe, era o mínimo que podia fazer por ela. ;)

      Mas já passaram seis anos, não chega de castigo?

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  6. O que importa é que tens a cara e o cabelo um bocado baços.
    Devias ver isso. Deve ser falta de vitaminas.

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    1. Aquilo é um enxame de mosquitos, então não se vê logo?
      Quer dizer, a foto tem seis anos. E, naquela época, usava-se andar assim, cheia de bichos na cabeça.

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  7. Ciúmes !
    Ciúmes da Mel !
    E falta a presença de um "verdadeiro " Mio no lar !
    Não viste como reagiu com o representante do condomínio ?
    :)
    Não percebem nada disto !


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    1. Pois são. Mesmo, coitadinha.
      Ela está esterilizada, não deveria querer Mio nenhum...
      E o administrador é tão, mas tão gay... acho que a irritou, mais nada.
      :)

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  8. Um borrifador com água, cada asneira, cada borrifadela. Costuma ajudar com gatos... com pequenas leoas, não sei. Mas que é linda, Linda, é ;)

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    1. Coitadinha :)
      Cada vez que ela faz porcaria, ralho-lhe, mas depois, estou tão ocupada a limpar e a meter tudo para lavar, que até me esqueço de ser mais enfática. Sou uma mole, é o que é.

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    2. Deixa lá, eu nisso sou tal e qual, até ralhar me custa. Por isso é que gosto do borrifador, não os intimida nem assusta, apenas o acham inconveniente. Tem é de ser na hora da asneira, caso contrário não associam o desconforto ao acto.
      E tem ainda outra vantagem relativamente ao raspanete, não encaram os humanos como a fonte do estímulo e consequentemente não ficam "amuados" com eles :)

      (Para o problema da marcação, podes tentar usar a técnica de esfregar uma compressa na lateral do focinho dela, junto à boquita (isto se não correres o perigo de ficar sem uma mão na manobra) e depois esfregar essa mesma compressa no sítio que ela costuma marcar. Outra hipótese é mudares temporariamente a comida dela para esse mesmo local).

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    3. Acredita que vou usar as duas técnicas, a partir já de hoje — borrifador e compressa (nem que tenha que usar um pau esticador, como aquela coisa de dar carne aos leões através das grades :) Estou a exagerar, como é óbvio). Se não der, meto-lhe mesmo a comida ao lado da porcaria (embora ela seja tão anoréctica que, se calhar, até agradece...).
      Obrigada, Ratinho :)

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