10/10/2015

Há lugares onde não há loucos

Eu não tinha prometido não voltar ao ginásio sem encher a cabeça de café?
Pois, e porque o prometido é o indevido, especialmente quando se trata de autopromessas, lá fui.
Ficar deitada em cima da única tábua que range, numa sala inteira, só é a melhor opção para quem quer rapidamente acordar, ou se está nas tintas para o que pensem de si os restantes ocupantes daquele espaço. Sobretudo no momento em que é suposto rebolar de um lado para o outro, e, vindo do nosso corpo, ecoa o som crrraaaac — e não, não passamos por carunchosas. É por flatulentas, mesmo.
(Tenho que decorar as coordenadas exactas de onde fica aquela tábua, a ver se a evito.)
Em piores lençóis estaria uma senhora, a quem Pilateiro mandou, como a todos, respirar profundamente, o que ela levou profundamente a sério. Entre os meus crrraaacs e a ofegância dela, entre a minha aparente ventosidade e o xitex despropositado e desproporcionado dela, fico-me pela primeira, como diz o outro (o povo).
No meio daquilo tudo, obviamente que teria que dar-se o momento pico-da-abstinência-cafeínica, que foi quando o mestre, em pleno roll like a ball, nos ordenou Agarrem os gémeos, e eu procurei, ávida mas discretamente, as duas pessoas mais parecidas daquela sala. 
~
Tomei café, mas começo a suspeitar que a máquina do ginásio só vende água de lavar chávenas, porque a vida continuou louca.
A chuva perturba-me o sistema nervoso central. E o periférico também. Já agora, o somático, o autónomo e o simpático, tudo a eito. 
Antes da recta em que termina a A5, exactamente na última curva, as duas faixas, da direita e do meio, tinham carros seguidos, em marcha lenta, e a quatro piscas. Pensei num acidente, depois no transporte de materiais perigosos, depois numa ambulância de transporte de politraumatizado, depois num funeral — só desgraças, portanto. E improbabilidades, numa autoestrada, mas camandro, welcome to Portugal! —, quando passei pelos oito ou dez carros que iam a provocar o congestionamento daquelas duas filas, e se me fez luz, que não foi de sirene nem de quatro piscas, e vá que não me caiu nada ao chão porque isto está tudo preso por arames: era um casamento.
Um casamento em marcha fúnebre. Numa autoestrada. 
Apeteceu-me tanto chorar.
Apeteceu-me tanto rir.
Fiquei tão ambivalente que não fiz nada. Corri dali para fora, em marcha à frente, meti-me nos braços da minha mãe, e finalmente percebi (apenas hoje), por que é que naquela casa só há loucos quando eu entro. Depois, saio, e os loucos saem todos atrás de mim.


Sem comentários:

Enviar um comentário