Passei por ali e estavam as duas a conversar. Ou melhor, uma escutava, enquanto a outra ensinava (já vão perceber o itálico). Claramente, avó e neta. Uma avó vulgar, como as avós de agora (já não se fazem avós gordinhas e de pés inchados, que nos ensinavam a fazer tricô e nos conheciam todas as manhas pelo timbre e pela entoação, avó-óó... Acho que já nem titis se fazem — eu tive uma titi que foi a maior escola de lavores femininos, cozinha e doçaria e artes que alguém, com um mínimo de alma de artista, pode aspirar ter. A minha titi foi a última peça da fornada das titis perfeitas). As avós de agora são modernas, magras, usam o cabelo curto e algumas até trabalham. Outras fumam. Qualquer dia, tatuam-se.
Pensando bem, esta era uma avó muito invulgar. Retiro o que disse ao início.
A neta era uma menina vulgar, igual a todas as netas do mundo, mesmo aquelas que se faziam dantes (eu também fui assim, por isso é que sei). Tinha uns três anos, ainda toda refegos de bebé, cabelos escuros encaracolados, bochechas de anjo renascentista. E estava parada — paralisada.
- Estás a ver? É um coelhinho. Não parece, pois não? Mas é, só que está sem pêlos. Foi esfolado.
(Perceberam o itálico?)
Acho que adormeci e desatei a ter um pesadelo, assim, sem aviso. Nele, a bruta prosseguia a patológica lição de anatomia patológica com a comparação com os gatos.
- Estás a ver? Parece um gatinho. Mas não é, é um coelhinho. Tu gostas mais de gatinhos ou de coelhinhos? Nós comemos os coelhinhos, mas não comemos os gatinhos... só comemos os gatinhos se o senhor do talho nos vender gatinhos em vez de coelhinhos. Chama-se a isso gato por lebre.
Então eu interferi, intercedendo. E já ia explicar a diferença entre gatos e lebres.
Depois acordei e já estava longe, na outra ponta do território continental, a bruta eclipsara-se pelo chão abaixo, sugada pelo Hades, e o anjo dos caracolinhos e dos refegos, afinal, tinha ensurdecido por momentos e não tinha ouvido nada do que a avodrasta malvada lhe tinha dito.
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De uma vez por todas: não há como confundir um gato com uma lebre ou um coelho, mesmo que esfolados. Começa pelo formato da cabeça e pela colocação dos olhos no crânio. Mas, se dúvidas houver, vá lá mais uma achega: os gatos não têm incisivos à frente (têm micro-dentes), e os dos coelhos são tão visíveis que até de boca fechada se vêem.
Ninguém come um gato se quiser comer um coelho.
(Parece que nada me soa bem, ultimamente.)
Cruzes, canhoto, saracanhoto!!
ResponderEliminarBeijos, Lindinha. :)
Let's traumatize our children!
EliminarCredo, com avós destas...
Beijos, Marioca :)
ai minha nossa...eu flipava se ouvisse uma conversa dessas.
ResponderEliminarCoitadinha da criança. Não me admiro que haja para aí tanto maluco.
EliminarBem feito foi engolida pelo Hades.
ResponderEliminarBom dia Linda.
Beijinhos,
Mia
Pelo menos no meu sonho, foi. E esturricou-se para lá no caldeirão.
EliminarBom dia, Mia :)
Beijinhos
N tenho esse problema, n como nenhum deles :) (tenho pena do coelho, true...)
ResponderEliminarIdem :) (same here)
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