23/10/2015

Pensamento escatológico do dia # 13

Ponham-se no meu lugar.
Uma pessoa está a maquilhar-se e apercebe-se de que o lápis dos olhos, essa maravilha que nos faz parecer a Farah Diba, ou qualquer fêmea médio-oriental, está a precisar de ser aparado, pois nos anda a borrar a pintura a ponto de nos assemelharmos com um dos Kiss, esses grandes malucos da década de 70 do outro século, só que sem cuspirmos fogo nem sangue, e é porque não calha a provocarem-nos.
O afia-lápis próprio para o fazer (não é o mesmo dos lápis de carvão e de cor, é mesmo um afia especial. O lápis dos olhos também não é bem um lápis, embora pareça) tem uma pecinha incorporada, que é para, no fim da afiadura, se poder limpar a lâmina dos resíduos, exactamente por o lápis de olhos ser cremoso e mole, e deixar a lâmina toda nhanhada de negro (ou azul, ou verde, ou amarelo, sei lá de que cor é o lápis de cada uma. Eu sou dramática e trágica e mania que sou misteriosa, uso preto, ou cinzento escuro, morte, drama, catástrofe, desgraça, enigma).


Estava eu muito bem a sacudir os restos de lápis que haviam ficado agarrados ao afia, quando me caiu a dita pecinha para dentro da sanita. Fiquei um nico a contemplá-la, pensando cá para com o meu fecho éclair se valeria a pena tentar o resgate da coisa, ou se puxava o autoclismo, para não pensar mais nisso.
[Puxar o autoclismo para não pensar mais nisso — a ver se não me esqueço de reter esta ideia.]
Mas eu sofro do grave problema, quase patológico, que é o da personificação. Para mim, tudo tem alma. Sou um São Francisco de Assis das coisas. E condoí-me da pecinha. 
Fiz-me bombeira da retrete, soldada da paz cuja missão era o salvamento da pequena coisa, e muni a mão com um saco de plástico, qual luva de amianto que me protegesse da inimiga barreira que me separava da vítima indefesa.
Tirei a peça, a sentir a mão toda molhada.
E exclamei, algo vitoriosa, algo derrotada [que há-de ser como se sente todo o herói após um  árduo salvamento]:
- Grita-me constantemente o cosmos que o meu nome índio seria sempre Camisinha Rota.

4 comentários:

  1. Eu cá afio o lápis com o afia da minha filha... ela zanga-se muito coitadinha... assim como assim não tenho de andar toda enfiada na sanita como tu.
    Não tens 3 filhas??? Atão...

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    1. És uma mãe muito pérfida, pobre criança. A ver se a Assistência Social não sabe disso.
      Só uma é que pinta os olhos. Não consigo ensinar-lhes nada de jeito.

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  2. Podias ter poupado um saco. Eles agora são caros.

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    1. Não sei como não pensei nisso antes. Mãos nuas na sanita é que é de valente, quais agora mariquices de sacos. Bem feita que estava roto.

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