Deixei de comer carne em Janeiro, e não teve a ver com uma decisão de Ano Novo, até mesmo porque não foi no dia 1, apesar de não me lembrar em que dia foi. Sei que foi algo não maturado, como quase todas as decisões que tomei em definitivo, que se deu no momento em que abri o youtube por uma razão inútil qualquer e, sem que tivesse carregado em botão algum, abriu-se um filme que se passava num matadouro/ assadouro de porcos, e, desta forma, fiquei agarrada ao ecrã, ao horror a que assistia, à convicção de que nunca mais seria capaz de comer mamíferos, e, já agora, animal nenhum com patas em que a relação mãe-filho seja de dependência mútua nos primeiros tempos de vida. É este o meu diapasão: não é o facto de serem animais domésticos, animais criados exclusivamente para alimentar o Homem, animais que sofram a morrer (errrr...) (gosto particularmente da definição de "vacas felizes"), ou animais que, mais tarde ou mais cedo, se "esgotem" e tornem insustentável a alimentação humana. Para mim, e por enquanto, é assim, repito: animais com patas em que a relação mãe-filho seja de dependência mútua nos primeiros tempos de vida. Portanto, encontro-me ainda naquela fase hipócrita das pessoas que não comem carne, mas comem peixe, como se os peixes não fossem animais também eles, não sofressem ao morrer, etecetera. Toda a vida me fez confusão os olhos dos peixinhos quando me chegavam ao prato, porque continham o último olhar do animal, que deveria ser de agonia e desespero e eu, mesmo em miúda, já era esquisita e acreditava, de alguma maneira, que aquela angústia se podia transmitir quando engolisse a carne do bicho. E é que não deveria estar muito longe da verdade, pois parece que está provado que a hormona libertada pelo animal no momento da morte se conserva no organismo dele, e nós ingerimo-la, "inocentes".
Enfim, uma coisa de cada vez. Agora sou, de há uns meses para cá, piscitariana. Não fundamentalista, uma vez que continuo a cozinhar carne, porque respeito quem comigo mora. (Homens...)
Mudanças que senti, depois de abandonar a carne? Nenhuma. Não estou mais magra nem mais gorda, não tenho mais nem menos força, não melhorei a nível físico em coisa nenhuma (também era difícil), nem ao menos intelectualmente (idem). Não é mais barato alimentar-me só de peixe e vegetais, não é mais fácil encontrar refeições, até pelo contrário: nos restaurantes comuns, a panóplia de escolha resume-se a metade do menu, quando não a um décimo. Só estou mais feliz. E não, não é uma questão hormonal, é mesmo só por ter a consciência mais tranquila. E isso, parecendo que não, é um alicerce para a tal felicidade.
(Estou tão adulta.)