22/07/2015

Não MUDEi nada

Meti-me no MUDE, porque está calor e vento, e pareceu-me que a praia era aquela opção para quem não se rala de fazer de Mary Poppins de cuecas e sutiã, e ou fazer aquela esfoliação dentária, e ou a arriscar cegar-se de todas as vistas à custa do chapelão esvoaçante que os outros teimam em não atarraxar ao chão da praia e nos pode vir espetar-se right between the eyes, ou até mesmo neles todos, tudo dependendo do decúbito, se ventral se dorsal, ou da sorte maldita que cada um tenha. Nem me falem do Euromilhões, que era ganhá-lo e nunca mais me apanhavam na praia de chapéu de sol, à coitadinha, era mas era uma tenda sultânica que até parece que ouço aquilo outra vez, 

Ela nasceu em Bagdad 
e era a favorita do sultão
Porém, o rajá
em nome de Alá
resolveu conquistar seu coração
Ela sorrindo respondeu
'O meu coração já era teu'
Todo o grande amor tem a vida de uma flor
e quando o sultão descobriu a traição
mandou prender o rajá
jurou também por Alá
que não havia ninguém que lhe roubasse
a favorita do seu harém.

Mas então: eu queria ver as exposições do Christian Lacroix e a das fardas da TAP ao longo dos tempos. A do Lacroix, meh. Pouca coisa, metida nos cofres do edifício, que ficam nas catacumbas do - 1, tudo às escuras, proibido fotografar, proibido beber água — não vá uma pessoa tropeçar com a garrafinha aberta na mão, e manchar as coisinhas de monsieur Acruz. Vê-se em dez minutos e andou para cima, antes que adormeçamos com tanta penumbra a desoras. 

A exposição das fardas da TAP levou-me a jacto para outros tempos meus. Ia para rever as fardas míticas das hospedeiras dos anos 70 e o mítico Caravelle, e não me desiludi. Quer dizer, sei lá se foram míticos, mas a minha memória diz que sim. Desenhadas pelo estilista Louis Féraud, lembro-me de as ver em vermelho, azul e amarelo, conforme fossem hospedeiras de bordo, de terra, ou não sei de quê. Eu nem sabia o que era aerodromofobia, e já queria ser hospedeira, só para ter aquele pompom do chapéu delas. 




Também não sei porquê, fiquei com a convicção de que a minha primeira viagem de avião foi feita no Caravelle, e passei a endeusá-lo, mas isso pode dever-se ao facto de que percebo tanto de aviação civil como de astrofísica. Portanto, o bicho até podia ser uma charanga marreca que mal voava, tipo galinha, que eu ia sempre considerá-lo o passarão da minha vida. E a vê-lo em todos os lugares de interesse, inclusivamente na minha literatura da época, ainda a miúda tinha um nome espanhol e não franciú, mas ninguém se questionava acerca disso, nem de nada.



Penso que fui também na doce ilusão de reencontrar o cheiro do aeroporto da Portela daqueles tempos. Há cheiros que associamos indelevelmente à infância, como o da papa Cerelac*. Eu, foi o do chão da sala de embarque e do chão da sala das chegadas. Aquilo estava sempre demasiado limpo, os meus sapatos tinham solas demasiado lisas (será que me calçavam uns patins?), ou eu era demasiado qualquer coisa, que me lembro demasiado bem do cheiro do chão do aeroporto. Isso e a rijeza da pedra, contra a minha cabeça. Até ficava ali uns segundos a pensar se era caso para me levantar ou se podia continuar deitada ao comprido, a ver passar pés ao nível do meu nariz, enquanto — juro que isto é verdade — ouvia passarinhos a pipilar à volta da minha cabeça, que era um inferno para me livrar da passarada, sobretudo porque ainda não era tão amiguinha dos animais como sou hoje e doía-me sobremaneira o galo acabadinho de conquistar em plena testa.

No final da visita não guiada (portanto, em piloto automático), veio a menina lá deles avisar-me que eu não podia tirar fotografias ali dentro. De facto, chico-smart estava com um violento ataque de soluços e fazia aquele ruído do flash, a cada disparo dos meus, qual Bonnie (aquela do Clyde). Tive que lhe fazer a expressão mais paparazzi que encontrei no meu cardápio, respondendo que não tirava nem mais uma, mas que não apagava nem uma. Acho que a baralhei com esta lógica matemática, mas vá que a poupei a mais uma variável e evitei dizer-lhe que já levava no papo do chico umas boas três dezenas de retratos. Um dia vou presa, por praticar ilegalidades. Espero que me levem cigarrinhos à prisão, que eu volto a fumar no dia em que me enjaulem.

* não me pagam, mas, se quiserem, esta até em géneros aceito.

2 comentários:

  1. Anónimo23/7/15

    Quando estiveres "dentro" havemos de fazer uma excursão e vai ser tudo muito lindo. Pomos a conversa em dia, e levamos um bolo com uma lima, daquelas que serrem mesmo a sério, sem que ninguém perceba. Depois, é só esperar-te com paciência, e serás capa de jornal. Um avião estará preparado para te levar até Bora Bora, que, aliás, foi o que acabaste de fazer, logo, a viagem até não será muito longa, e gozarás de fama internacional. O que uma simples fotografia não permitida pode fazer pelo destino de uma pessoa. Há coisas...
    Beijinhos Linda,
    Mia
    Beijinhos,
    Mia

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    Respostas
    1. Visto assim, parece-me a jaula e sua evasão uma aventura que ainda quero viver. :)
      Tu tens uma imaginação prodigiosa, Mia. Mas eu alinho. E levo a lima!
      Beijinhos :)

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