As pessoas partem aos bocados. Partem-nos aos poucos. Saem de nós por partes.
A mim, tem-me feito falta a sua voz.
Por isso, sonho — com o tom, com o timbre, com a musicalidade —, mesmo que nunca cante nos meus sonhos. Nos sonhos não canta, mas ouço-lhe a música em todas as frases. Talvez por saber que eu ouço música, não canta. (E como cantava, e tanto cantava.) Não sei o que diz, não me lembro. Acordo de manhã, ou então de noite, e não retive uma única palavra do que lhe ouvi, mas a voz ficou-me, inteira, e ainda permanece, inquebrável e eterna, nos primeiros minutos do dia. Mesmo no sonho, é um sonho que fale, porque na realidade sei que isso já só em sonhos. Somo mentalmente todas as palavras que lhe ouvi nos últimos quase dois anos e não conto dez minutos de felicidade junta.
Hoje bebi-lhe mais uns quantos silêncios. Ocorreu-me então que, se calhar, não ando a sonhar com a sua voz: enquanto durmo, ainda vem embalar-me o sono, ainda vem falar comigo, ainda vem dizer-me que está tudo bem - até mesmo quando, sufocada de lágrimas daquelas que só na adolescência e depois pela vida fora, me obrigava, carinhosamente, a beber um copo de água para as lágrimas irem embora, e depois me perfumava o cabelo e o contorno do rosto com água de colónia a cheirar a limão.
(Pode ser por isso que, ainda hoje, o meu perfume cheira a limão.)
Que te embale sempre.
ResponderEliminarVou sempre ouvi-la, Be.
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