mas é que hoje ia-me afogando.
Neste momento, sou ex-pré-pré-afogada.
Mas valeu a pena. Fui salva por um sereio, que parecia caído sei lá de onde, mas que do céu é que não era.
Deu-se que verifiquei que uma das minhas crias se encontrava em semi-apuros, tendo em conta que nadava, nadava, e não saía do mesmo lugar, e do que é que me lembrei, assim no imediato? Vou lá salvá-la. Eu já tirei filhos do mar, até filhos que não são meus e a quem amo como meus, ou portantos, esta era só mais uma. Esqueci-me foi de dois pormenores: 1 - Eu já não tenho as forças que tinha há 6 ou 7 anos; 2 - Eles já estão maiores e, por conseguinte, mais hábeis para se desenrascarem sem mim. Porém, quis que se lixassem os pormenores, e vai de me enfiar mar adentro. Se estivesse aqui a Blue, com aqueles retoques poéticos dela, já estava a dizer que se o mar lhe tragasse uma cria, havia de a tragar a ela também e merdas.
Ora, lá chegada, ambas fora de pé, dei-lhe o braço para ela se segurar e pus-me a nadar, tipo em seco, pois que não saía do mesmo lugar. Aliás, julgo que ainda nos arrecuei uns centímetros largos na direcção da linha do horizonte, aquela tal que a outra diz que prega lá os olhos, onde acaba o céu, haja pachorra.
A seguir, quase morta de cansaço e de vergonha, mas ainda sem ter bebido um golinho sequer de água — portanto, em fase de pré-pré-afogamento — resolvi avisar o rapaz de que não se aproximasse de nós, pois estávamos incapazes de sair dali. Tipo o povo, quando está agarrado à corrente eléctrica, se algum se aproxima, também lá fica. Mas acontece que ele não podia ser mais parecido comigo, e entendeu vestir a capa de super-herói e salvar as duas. Lá chegado, estendeu-me um pé (mesmo à gajo), e foi quando aquele anjo vestido de amarelo me surgiu e perguntou se estava tudo bem. Daí a salvar-me e trazer-me para terra e para a Terra, foi um traque (não dei, já disse que sou uma senhora). Os outros dois acabaram por sair pelo seu próprio pé, imagino que verdes de vergonha da porra de mãe que lhes havia de ter calhado na rifa.
Uma hora depois, ainda consegui perdê-los aos dois na praia: meteram-se mar adentro com as pranchas e lá tive que ir aborrecer o meu salvador outra vez — que, coitado, correu a praia de lés a lés, ainda saiu da sua área de intervenção, só para me dar apoio, que já quase chorava que este estava a ser o pior dia de praia da minha vida. Quando eu já via tudo negro, os outros dois acabaram por surgir, saídos da água, pranchas debaixo do braço, imagino que verdes de vergonha da porra de mãe que lhes havia de ter calhado na rifa.
E sim, odiei. Ia indo com os porcos.
(Antes vento e chuva e tempestade e os olás-fresquinhos e as tatuagens no rabo e os fogareiros e os pique-niques e as crianças que nos aventam areia e o genital.)
Há algumas coisas que sei da vida, muitas que ignoro, mas de uma tenho a certeza: nunca seria capaz de, após tal situação, conseguir escrever algo tão escorreito -- e divertido, dado o contexto. Sangue frio a rimar com bom humor. E derrotar assim o mar é nascer de novo.
ResponderEliminar(Já havia tempos que não me deparava com a palavra «aventar».)
Modéstia tua, Xilre.
EliminarA mim, restava-me apenas a alternativa, que era pegar pela Blue e rasgar aqui um dramalhão. E hoje não me apetecia. Renasci há demasiado pouco tempo para já estar a ver a vida em tons que não sejam aqueles azuis lá dela.
(Uso bastante "aventar", na linguagem falada. É uma palavra com cheiro a vento, como diria a Blue.)
deixo um abraço, Linda.
ResponderEliminarobrigada, linda (és tu). Outro, daqueles com muitos braços.
Eliminarum afogamento falhado, felizmente, um salvamento materno muito incompetente, um salvador a abarrotar de boa vontade e profissionalismo. episódio épico, Linda Blue, que ia indo com os porcos.
ResponderEliminarAinda bem que pudeste escrever assim , ainda bem, agora muito a sério.
beijinhos.
Foi um susto, Mia, íamos indo as duas, Blue and I.
EliminarObrigada, querida. Não sei o que ia ser de mim sem vocês.
Beijinhos, boa noite.
Como é possível estar-me a rir com uma coisa destas mas estou, minha Linda Porca. Sei de certezinha que se fosse a Blue estaria aqui a chorar o mar que te quis engolir.
ResponderEliminarBeijos
(Tive de salvar macaquito numa piscina tinha ele quatro anos, ainda sinto a angústia.)
Eu própria escrevi-o a rir, Be. É a fórmula mais eficaz para não chorar.
EliminarNão acredito muito que a Blue não apareça aí a meter a colher do dramalhão um destes dias, ou horas.
Beijos :)
(São momentos demasiado salgados ou clorificados, para que o coração de uma mãe aguente impune.)
também sou um ex-pré-afogado ou pré-pré... vexado por uma sereia que me deu a mão quando já estava de gatas na areia... estou solidário...
ResponderEliminarFoi tão achincalhante. Ainda por cima, no último momento, ainda levei com uma onda pelas costas e fiquei com um cabelo péssimo. Ter sido regatada naquela figura, quase sem ar e a balbuciar, deve ter sido dos momentos mais "corta!" do filme da minha vida...
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