Nunca como agora me dei conta desta aflitiva e aflita incapacidade para dizer adeus, que toma conta de mim como se eu fosse uma criança.
Já tinha destrinçado a palavra — a-Deus (vais para Deus, ou até Deus, ou até quando Deus quiser) —, já tinha tentado substituí-la por um até à próxima — nunca aderi ao tchau, porque amo a minha língua, da forma como ela é falada no território nacional —, um até amanhã (mesmo que o reencontro só se dê daí a uns dias ou semanas), ou um até breve (que pode ser uns anos depois, que importa?).
Pode também ser por isso que digo adeus quando me despeço, ao telefone. Ou quando saio do chat. Ou quando me afasto de alguém que sei que vou ver em breve. Por não acreditar no adeus-adeus, para sempre.
Ontem, nem de propósito, nem por acaso, os meus olhos bateram neste graffiti,
(Alcântara Terra — Ex-Casal Ventoso)
E fiquei a cantarolar E depois do adeus. Nota de partida da Revolução. Nota de partida de todas as revoluções que haja em nós.
Também fiquei assim porque nunca disse adeus a demasiados deuses que se me foram sem dizer adeus e que se transmutaram em mortos queridos. A uns, porque a vida não me deu tempo ao tempo, a outros porque fui eu que não quis dizer, cobarde ou distraída. Nos últimos dias de uma pessoa minha, quando, em lágrimas — por sentir que iniciava a viagem naquele momento —, se quis despedir de mim, a única coisa que me saiu, à laia de adeus, foi, Vamos para a praia para a semana, sabendo eu e ela também que não haveria mais semanas nem praia.
Estamos, estou, cada vez mais só. Ocorre-me, mais uma vez, como desde há meses para cá, a parábola do recreio da escola primária, em que brincam uns, sob o comando de um ou dois, não necessariamente os mais fortes ou os que inventam as melhores brincadeiras, enquanto outros assistem, impossibilitados de participar, ou simplesmente desinteressados. Há ainda aqueles que não chegam a descer até ao recinto do recreio, ficando na sala a ocupar o seu tempo, lendo, escrevendo, desenhando, longe da algazarra e, tantas vezes, do conflito. Quero muito manter-me nesta última categoria, por mais atractivo que me seja o recinto, por mais animado e descontraído que ele me pareça. Mas hoje, desde ontem, fiquei assim.
Quis saber quem sou
O que faço aqui
Quem me abandonou
De quem me esqueci
Perguntei por mim
Quis saber de nós
Mas o mar
Não me traz
Tua voz.
Estamos cada vez mais só. Tens toda a razão. Mas as crianças que mandam no recreio não são necessariamente as mais felizes :)
ResponderEliminarDeixo um beijo LP
Nunca são, e depois, pela vida fora, repetem o modelo :)
EliminarUm beijo para ti, Imp.
Eu, que solitário me confesso, brinquei muitas vezes sozinho. Adorava o recreio mas também adorava as minhas brincadeiras sozinho. Ainda hoje sou assim ;-)
ResponderEliminarBeijos e até amanhã ;-)
p.s. Das mais bonitas canções portuguesas!
Eu também. Levava as bonecas e não chateava ninguém. Mas nunca fui marginalizada, a opção era minha.
EliminarBeijos, e até já :)
PS - E que voz, meu Deus, e que voz :)
Sim, é essencial aprender-se a dizer adeus. :)
ResponderEliminarBom dia , LP
O problema é que não há escola para isso, e eu sou uma péssima autodidacta nessa matéria :)
EliminarBom dia, JM
L. P. no seu melhor !
ResponderEliminarBoa tarde e "adeus" !
Obrigada!
EliminarAté logo!
Sugestão :
ResponderEliminarAté sempre ( como utiliza a minha Mãe )
Ui, tenho medo desses "sempres".
EliminarFaltam-me as palavras na hora de dizer adeus, por isso nunca o digo. Digo sempre "até breve", mesmo que o breve seja 50 anos depois. Não sou boa com estas coisas, não...
ResponderEliminarOlha, nem eu. Chego a parecer tonta. Digo uma coisa do género, "Vou-me despedir à francesa: au revoir"...
EliminarEu uso muito o "até logo". Não sei por que razão, talvez por não parecer tão definitivo.
ResponderEliminarBeijinho, LP.
Tal e qual. Prefiro enganar-me para mais do que para menos.
EliminarBeijinhos, Mia.