01/08/2017

Estou nas miras

Há muitos anos, éramos nós duas petizas, e estávamos hospedadas num hotel com os nossos pais. Ali se encontrava também uma família, com uma constituição em tudo semelhante à nossa: pais e duas filhas. No entanto, eram espanhóis.
Não sei se é verdade que as crianças têm uma linguagem universal através da qual se entendem, mas sei que travámos amizade com as duas hermanas d'el pays hermano, mesmo sem pescarmos nada do que elas diziam, sequer um jaquinzinho. E elas devolviam-nos exactamente na mesma moeda, apesar de, na altura, usarem pesetas e nós escudos. E apesar de termos fronteiras.
Não sabendo sequer os nomes delas, mas tendo percebido que, ao mínimo chamamento de "Mira!", elas olhavam, assumimos então que Mira era o nome próprio das nossas amigas de Verão, ainda que fossem irmãs. Tão-pouco estranhámos o facto de elas se chamarem Mira uma à outra. E era "Mira!" para trás e "Mira!" para a frente, com sucesso garantido.
Até que um dia, ao avisarmos o nosso pai de que íamos brincar com "as miras", e questionadas por ele sobre qual era o nome das meninas, foi diante das nossas respostas - "Mira"; "E Mira" -, que ficámos a saber que apenas tínhamos aprendido, e estado todos aqueles dias a usar e abusar do imperativo do verbo olhar.
Pergunto-me se as espanholitas não disseram aos pais que nós nos chamávamos "Olha e Olha". Mas nunca mais deixei de referir-me às mulheres espanholas como "as miras".

6 comentários:

  1. Anónimo1/8/17

    Até chorei a rir. Ai a inocência da infância.
    Estás um nadinha nostálgica, não estás? Eu sou uma saudosista e por isso percebo-te. :)
    AL

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    1. Acho que ando, sim, AL :)
      Apanho-me ao pé do mar e "vejo-me" muitas vezes noutras épocas. Ou "vejo" os meus, pequeninos, é muito mais meus.
      :)
      Sinais dos tempos...

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  2. Respostas
    1. Oh, obrigada :)
      (Olha quem fala, que escreve assim. Olha quem escreve!)

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