em que vais ali a passar acompanhada, e surge uma ela, que tu não conheces de lado algum, nem nunca viste mais gorda, quanto mais mais magra, que se vos dirige enfatica e entusiasticamente, vinda lá dos confins de um restaurante, ainda de tabuleiro na mão e avental no regaço, espeta dois beijos nele, dois beijos em ti [vá, perdoas, porque o conhece a ele e essa ordem de factores permite-lhe ganhar tempo para serem apresentadas uma à outra], toda ela arfante, luminosa de calor, cheiro a óleo de fritar num belo cabelo louro de ondas cerradas preso num rabo de cavalo selvagem, moldura de olhos âmbar, aquela cor que ninguém tem, e o brilho deles, a pele tisnada de tanto sol e ralações de Inverno, a boca crispada num desabafo profundo, a desbobinar o filme da parte mais ou menos bonita da sua vida num imprevisto relâmpago, que o Paulo — que ambos conhecemos — é o homem da sua vida, que gosta dele desde a faculdade, depois casou, depois enviuvou, depois reencontrou-o e percebeu que ele é que é para sempre, que deixou de lhe atender o telefone, que não lhe responde às mensagens, que viveu com ele três anos e agora é como se não a conhecesse,
— e faz pausa diante da nossa incredulidade e balbucios, e depois larga a bomba —,
Mas o que é que ele quer? Eu até pensei em suicidar-me!
Nós não passamos do monossílabo, de escancarar bocas e olhos e que sim com as cabeças, mais dois beijinhos a cada um e até sempre.
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