12/05/2019

Chamando os bois pelo nome. Nespresso!

Dou-me mal ali. Não há vez, ultimamente, em que não tenha um dezaguisado. E o problema está lá, não sou eu. 
Se a minha vida não dava para o argumento de um filme de terror surrealista pejado de bizarrias, então também não serve para mais nada.
Verifico pela hora de entrada impressa na minha senha de vez que estou ali há dez minutos sem que as três pessoas que ocupam os três balcões de atendimento abertos tenham acabado o seu aviamento: um casal em que ela é neutra e ele é daqueles carecas que não têm cabelo (Lili Caneças, és grande!), mas têm pêlo espesso a partir da traseira da cabeça, que lhes desce nuca abaixo e se enfia pelos colarinhos quero lá saber até onde; um estrangeiro que tem milhares de assuntos a tratar na Boutique, a avaliar pelo modo reunite que adoptou; uma senhora entradota, magra, seca, estilo senhora dona marquesa, que degusta um cafezinho no próprio balcão de atendimento, que isso do bar é para a plebe (como a compreendo, titi). Bem, sou apenas chamada ao décimo-quarto minuto, e porque, entretanto, aconteceram duas desistências (suponho que de duas pessoas assim mais normais como eu, que foram deprimir em posição fetal / praticar harakiri para baixo do balcão do bar). A registar que, entre o décimo e o décimo-quarto minuto, o casal neutra-careca cabeludo acabou de ser atendido, e aproveitou a saída do funcionário para lhes ir buscar a encomenda lá àquele buraco/ mina/ paiol/ poço onde agora vão buscar os saquinhos, e desatou aos linguados, como se estivessem na sua alegre casinha, tão modesta quanto eles, em tudo lembrando Ordralfabetix, o peixeiro; o estrangeiro agarrou em dois sacos, um contendo uma máquina nova e outro milhares de cápsulas, e deu um bacalhau à que o atendeu; a senhora dona marquesa acabou de sorver a beberagem e pirou-se sem levar nada nem coisa nenhuma, sequer um peixe.
Nos entrementes, aparecera por ali um casaleco daqueles em que ambos usam mochila, montes de sacos de lojas e um petiz de quatro anos ao colo dela, aquele bebé que justifica a ainda e para sempre proeminente barriga, que passa por gravidez para quem não sabe. Tiraram senha de prioritários, ela passou o rapaz para os braços dele e ele desandou dali para fora com a justificação da prioridade pelo mão e pelo seu próprio pé. Ela foi atendida e ainda se deu à lata de ir beber calmamente a bica ao balcão da degustação.
Olhem, eu ia-me dando uma coisa. É claro que quem levou comigo foi o desgraçado que me atendeu. Tudo em voz suave, para não doer tanto e não perder a razão (estou uma senhora, eu):
- Contei dez minutos sem que mudasse a vez das três pessoas que já estavam a ser atendidas quando aqui cheguei. E há também aquela senhora do bebé enorme, que está a ser atendida com uma prioridade da qual não pode fazer-se valer. Garanto-lhe que, para a próxima que aqui vier, tiro senha de prioritária e ai de quem duvide da minha doença. Vou fazer como as malucas, que dizem que "a minha doença não se vê".
Pronto, e saí, para aí ao cabo de quinze minutos de ali ter entrado (sim, porque o meu atendimento leva um escasso minuto). Fica o aviso.


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