12/08/2018

Dancei, mãe

Hoje acordei infeliz e dancei, mãe. Não dançava há dois meses. Não era capaz de me mexer ao som da música, as pernas tristes, a anca infeliz, já para não falar dos braços, um desalento de dar dó. Estava à espera do dia em que acordasse contente e tivesse vontade de dançar, mas o dia não veio e hoje fui assim mesmo. 
(Não para me alegrar, não para espantar a tristeza - como se ela permitisse uma coisa dessas -, mas para lhe dar largas e deixá-la voar comigo.)
(Ela é volátil.)
Tenho sonhado consigo, mãe. A mana sonhou todas as noites desde que nos vimos pela última vez
(que saibamos)
agora sou eu que sonho. Revezamo-nos a cuidar de si, outra e mais outra vez. 
Quando tomei duche, havia manchas de sabonete em forma de coração aos meus pés. 
(Muitas gotas de água, também. Nem todas saíam do chuveiro, pelo que me pareceu.)
Não sei interpretar estes sinais que a vida me dá 
(são sinais ou eu estou maluca?)
mas acho que era outra vez Alguém a dizer-me que estivesse descansada, que sossegasse o coração
(esta pedra)
que a mãe está bem.
E que eu pare de sonhar, também.