20/08/2022

Travão de mão, travão de pé, travão de dedo

A frota do lar, se contabilizadas todas as viaturas de que já fomos alegres proprietários, tem variado alguma coisa em termos de tamanho, em função do número de elementos que compõem la famiglia. Quando começámos, éramos dois e um Y10, que ainda aguentou uma petiza — embora muito mal, já que a cadeirinha não cumpria o efeito de concha em caso de embate ou travagem brusca, tão curta era a distância entre os bancos da frente e os de trás (parecia um avião, sim. Ou o Coliseu dos Recreios) —, mas já não aguentou duas, e, assim, fomos indo ao mercado automóvel de cada vez que esta barriga se enchia de vida. No último, ricos em sonhos filhos e pobres em ouro, tivemos que enveredar pela via da segunda mão no volante, que é como quem diz, dos usados. E, assim, tivemos a primeira de três monovolumes de sete lugares (o sétimo era conhecido por “o lugar da sogra”, que ficava à porta e era, idealmente, para ser usado sem cinto de segurança em percursos com curvas muito apertadas. Calma, não estava destinado à minha mãe). A última que tivemos, aqui designada por “o camião”, resolveu falecer o ano passado, assim do nada, a meio do nada, ou seja, de uma autoestrada. 

Sejamos francos: já nunca andamos os seis no mesmo carro em simultâneo, pelo que o arranjo do camião — que ficava mais dispendioso do que o valor de mercado dele — era mais um capricho (bastante meu) do que uma necessidade. E, assim, entrou para o parque automóvel desta barraca o primeiro carro com travão de dedo.

Enquanto condutora do camião, não posso dizer que tenha tido grandes dificuldades em utilizar o travão de pé: o carro destravava-se com uma alavanca mais ou menos escondida, como a do combustível, e travava-se com aquele quarto pedal à esquerda, que nos exige um alongamento ao nível da correspondente perna, mas que é um stretching que só faz bem. No entanto, tal sistema não só é perigoso por ser tão fácil destravar o carro — e ele há crianças muito irrequietas e imaginativas —, como também é impossível a qualquer passageiro travar o carro no caso de o condutor (inadvertidamente…) o deixar destravado. Por acaso, nós fomos muito mais neuróticos com os filhos do que os meus pais foram connosco: iam tomar um café à Pastelaria Roma, enquanto nós ficávamos as duas a apitar até endoidecermos um quarteirão inteiro.

A mais recente aquisição automóvel tem, como já disse e nunca é demais repetir, travão de dedo: carrega-se num botão e trava, carrega-se outra vez no botão e destrava. Se a possibilidade de os passageiros poderem travar o carro está resolvida, a de as crianças o destravarem não está. Nem para elas, nem para humanas como eu. Aquilo ora acende uma luz quando trava, ora apaga a luz não sei quando. E é que nunca me lembrei de ir verificar ao painel se aquele P estava aceso. Parava o carro, carregava no botão, dava assim uns abanões para a frente e para trás e era desta forma que achava que sabia se o boi estava manso ou não. Outro dia abanei-me no banco e ele não se moveu. No entanto, deixei-o destravado. Vá que foi num plano sem inclinação. A partir desse dia, nunca mais lhe toquei, não vá ele dar uma de touro mecânico. Tenho minha Rosinha e somos muito felizes a gente as duas.

Conclusão: que prejuízo e que espaço ocupava a velha trave do travão de mão para andarem com invenções destas? Já só falta inventarem o travão de testa, se é que me faço entender. Vou fundar um movimento qualquer, #naoabrimosmaodotravaodepuxarparacimaeparabaixo.