04/01/2024

Post com dois assuntos cientificamente relevantes

Tenho um clube de formigas extremamente pequenas no lar. Deslocam-se em carreiros, desconheço onde é o formigueiro, mas já salvei a vida a umas dezenas delas. É que se afogam numa gota de água, apesar de terem uma resistência louvável. (Nem sei se têm pulmões, mas devem ter.) Ontem estava a beber água por um copo, espreito lá para dentro e vejo uma delas, muito sossegadinha, muito quietinha. Considerei preferível verificar se morta, se viva, mas a fulana não me agarrava o dedo, para que eu pudesse colocá-la numa folha de papel de cozinha e devolvê-la às manas. Peguei então numa colher e retirei-a do oceano. Pensei mesmo que estivesse morta, porque continuou inerte. Quando a ia passar para o papel, vi mexer uma patita, mas ela não largava a colher molhada. Insisti na manobra e deve ter sido aí que a torci um bocado, pois aterrou no papel toda torta e baralhada. Também podia estar em pré-afogamento, coitada. Destorceu-se, endireitou-se e lá seguiu caminho toda manca, à procura das outras. E bebi a água, sim, que a vida não está para finuras.

Mas não era a isto que eu vinha, embora o tema formigas ainda não esteja esgotado. Fica para o último parágrafo.

Hoje entrei na quinta dimensão. Estava a cozer uns lombos de pescada na Biby — que ela coze pessimamente — e na receita mandava guardar a água da cozedura para depois a misturar com uma poção qualquer que já estava em preparação no meu caldeirão. Pus um coiso de palha por baixo do jarro e vai de verter o precioso líquido lá para dentro. Quando chegou à última gota, pás!, explodiu como que dinamitado. Pensando bem, acho que implodiu. Sei que era vidros por todo o chão da cozinha que chegavam ao corredor. E meio litro de água perfumada de peixe, que se transformou em cinco litros, pois era a minha calça, o meu pé e respectiva chinela (desculpem, mas tenho que acabar com este mito rural: eu sou como as outras pessoas. Ou pior), era o chão, era toda a bancada e a derramar-se para dentro das gavetas e armários. Valeu-me minha Sandra que, quando faço uma refeição em vez dela, até se lambe, parece que ainda tem maior ensejo para dar à matraca. Lado bom: ninguém se magoou, nem sequer com aqueles vidrinhos do tamanho da minha formiga (é assim que o cosmos me agradece) e também, menos um mono.

De vez em quando sinto um bichinho a passear pela minha testa, junto à raiz do cabelo. Depois desce, passa-me pelo nariz a atira-se em bungee jumping para o meu ombro. Há dias percebi que era uma formiga das minhas, se calhar veio agradecer-me ter salvo a coxa.

Hoje estava nas minhas danças e lá sinto outra vez um bicho pequeno a percorrer a minha raiz do cabelo. Sacudi com cuidado, para não assustar o animal nem o lesar e disse para a que estava atrás de mim: “Tenho formigas na cabeça”, que há-de ter sido a frase mais esquizofrénica que proferi na vida. Ela desesperadamente a tentar disfarçar o seu incómodo, “Pode ser algum champô que estás a usar”, mas eram de aflição os olhos dela quando eu esclareci: “Tenho imensas formigas em casa, nunca tinha visto umas tão pequeninas e, de vez em quando, uma ou outra vem passear na minha cabeça.”