20/10/2022

Entrançar a tristeza

A minha avó dizia que, quando uma mulher se sentisse triste, o melhor que podia fazer era entrançar o cabelo, desta forma a dor ficaria presa entre os cabelos e não conseguiria chegar ao resto do corpo; tinha que ter cuidado para que a tristeza não se metesse dentro dos olhos, porque os faria chover, tampouco era bom deixá-la entrar nos nossos lábios pois os obrigaria a dizer coisas pouco certas. Que não se meta entre as tuas mãos — dizia-me — porque podes torrar demasiado o café ou deixar a massa crua. É porque a tristeza gosta do sabor amargo.

Quando te sentires triste, menina, entrança o cabelo; agarra a dor na madeixa e deixa-a escapar quando o vento norte vier com força. 

O nosso cabelo é uma rede capaz de apanhar tudo, é forte como as raízes de uma árvore e macio como a espuma do atole. Que não te apanhe desprevenida a melancolia, minha menina, mesmo que tenhas o coração partido ou os ossos frios por alguma ausência. Não a deixes entrar em ti com o teu cabelo solto, pois ela fluirá em cascata pelos canais que a lua traçou entre o teu corpo. 

Entrança a tua tristeza, dizia, entrança sempre a tua tristeza.

E, na manhã em que despertes com o canto do pardal, vais encontrá-la pálida e desvanecida entre o tear do teu cabelo. 

Traduzido, na medida do possível, do original de Paula Klug, via Instagram Cultura Inquieta.


Ainda me faltam alguns centímetros de cabelo para poder entrançar a tristeza de não o ter.