24/09/2019

A carne é forte

Deixei de comer carne em Janeiro, e não teve a ver com uma decisão de Ano Novo, até mesmo porque não foi no dia 1, apesar de não me lembrar em que dia foi. Sei que foi algo não maturado, como quase todas as decisões que tomei em definitivo, que se deu no momento em que abri o youtube por uma razão inútil qualquer e, sem que tivesse carregado em botão algum, abriu-se um filme que se passava num matadouro/ assadouro de porcos, e, desta forma, fiquei agarrada ao ecrã, ao horror a que assistia, à convicção de que nunca mais seria capaz de comer mamíferos, e, já agora, animal nenhum com patas em que a relação mãe-filho seja de dependência mútua nos primeiros tempos de vida. É este o meu diapasão: não é o facto de serem animais domésticos, animais criados exclusivamente para alimentar o Homem, animais que sofram a morrer (errrr...) (gosto particularmente da definição de "vacas felizes"), ou animais que, mais tarde ou mais cedo, se "esgotem" e tornem insustentável a alimentação humana. Para mim, e por enquanto, é assim, repito: animais com patas em que a relação mãe-filho seja de dependência mútua nos primeiros tempos de vida. Portanto, encontro-me ainda naquela fase hipócrita das pessoas que não comem carne, mas comem peixe, como se os peixes não fossem animais também eles, não sofressem ao morrer, etecetera. Toda a vida me fez confusão os olhos dos peixinhos quando me chegavam ao prato, porque continham o último olhar do animal, que deveria ser de agonia e desespero e eu, mesmo em miúda, já era esquisita e acreditava, de alguma maneira, que aquela angústia se podia transmitir quando engolisse a carne do bicho. E é que não deveria estar muito longe da verdade, pois parece que está provado que a hormona libertada pelo animal no momento da morte se conserva no organismo dele, e nós ingerimo-la, "inocentes". 
Enfim, uma coisa de cada vez. Agora sou, de há uns meses para cá, piscitariana. Não fundamentalista, uma vez que continuo a cozinhar carne, porque respeito quem comigo mora. (Homens...)
Mudanças que senti, depois de abandonar a carne? Nenhuma. Não estou mais magra nem mais gorda, não tenho mais nem menos força, não melhorei a nível físico em coisa nenhuma (também era difícil), nem ao menos intelectualmente (idem). Não é mais barato alimentar-me só de peixe e vegetais, não é mais fácil encontrar refeições, até pelo contrário: nos restaurantes comuns, a panóplia de escolha resume-se a metade do menu, quando não a um décimo. Só estou mais feliz. E não, não é uma questão hormonal, é mesmo só por ter a consciência mais tranquila. E isso, parecendo que não, é um alicerce para a tal felicidade.
(Estou tão adulta.)


6 comentários:

  1. Mesmo o peixe... Creio que nestes tempos o consumidor terá que pensar que não pode fechar os olhos quanto à origem daquilo que come. Não pode abster-se de investigar. O peixe de aquacultura é da Turquia? Bem, o mais certo é estar embriagado de antibióticos, tal a intensidade da produção (o custo do preço baixo do robalo...). O peixe-gato dos filetes é donde? Ah, do Rio Mekong, no Vietname, um dos mais poluídos do mundo. A ameijôa de origem asiática? Desse profícuo rio, também... O melhor é seguirmos o conselho de Michael Pollan, autor de The Omnivorous Dilema: «Eat food, not much of it and mostly plants» (e em «food» excluir o que é mais que dúbio).

    Boa tarde, LB.

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  2. Olá Linda,
    Compreendo e aceito ,mas eu...eu falecia !
    Muito bem poupares os " homens da casa ". Essa dos olhos dos peixinhos , até me doeu o coração. E eu que sou pescador. Vegetais só q.b. Reconheço ser um bicho pouco adaptável a mudanças. Ainda ontem almoçei um belo dum "teclado " com babete fornecido pelo restaurante e tudo à " la mano " . Consolei -me. Olha nem vou pensar mais ... irei continuar !!!;

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  3. Eu acho que a ideia de reduzir e responsabilizar faz muito sentido, mais do que cortar completamente com fundamentalismos. Custa-me muito a producao de leite, por exemplo, e conheco bem a industria por dentro. Custa-me o transporte ate ao matadouro e porque tao novos? Nao me custa comer animais, mas custa-me a vida que esses animais tiveram ate chegar 'a minha mesa, e luto para que tenham uma vida melhor e que os que os produzem, o facam de uma forma mais humana e sustentavel.

    O que me parece pior e' o desperdicio. Comemos demais: carne demais, batatas demais, massa demais, doces demais, acucar demais, sumo demais. Nao so a terra nao consegue sustentavelmente manter este consumo como depois gastamos rios de dinheiro a desgastar o que comemos a mais: no ginasio, em dietas parvas, em cosmetica, em cirurgias plasticas, etc. Pior, chega a um ponto que nada disto chega, e a nossa sociedade paga forte e feio em tratamentos para o cancro, diabetes, doencas cronicas do coracao e figado, etc. Tudo, mas tudo, causado pelo nosso primeiro excesso.

    Falo contra mim, que sou gorda e sofro de ansiedade e depressao (as vezes) e me refugio dos doces e comida. Mas tantas e tantas vezes faco as contas ao que este donut, oferecido no sainsbury's num pack de 5 por 50 centimos, me vai custar para o desgastar, ou pior, em comprimidos e mal-estar no combate as doencas que ele e os amigos dele me causam. A isto os economistas chamam custo de oportunidade - nao e' os 50 centimos que dispendo, mas o verdadeiro custo do donut e' o que deixo de ter para o poder consumir.

    E acho que os precos das coisas estao altamente desajustados e que precisamos de internalizar os custos de oportunidade. Um croissant de chocolate tem que custar 10 vezes mais que uma caixa de morangos, porque o seu custo energetico de producao e custo na cadeia alimentar e repercussoes na saude e' multiplas vezes maior. E fico doente ver aqui, no UK, o kilo de carne de porco a £5, o kilo de acucar a £1, e as bolachas e bolos pre-feitos sempre em promocao... Como e' que um bolo de kg de limao custa £2.30 e um so limao, no stand ao lado, custa £0.35p cada? O tomate £1.90 por embalagem de 200 gramas... mas os molhos bolanhesa pre-feitos custam £1.20p por 500gr? E de um lado temos frango (do aviario) ja assado de rotisserie a £4, vs frango do campo por cozinhar na embalagem a custar £17 porque e' "organico".


    Ando muito irritada com a ineficiencia economica do sistema capitalista... e com o que custa privadamente a uma familia comer bem, fruta, vegetais, pouca carne mas de qualidade, vs o que custa a toda uma sociedade em saude as familias que nao ganham para comer bem, e comem salsichas com batatas fritas todos os dias.

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  4. Tás uma crescida 😘
    Eu abandonar a carne ainda n me deu para isso, mas eu tb n como assom tanta, e basicamente só como as brancas (pelos vistos sou racista na carne 😂)

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    1. Uma senhora 🙂😘
      As vacas agradecem! 😁

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  5. Meus caros J, Magalhães e AEnima,

    Não respondo um a um aos vossos comentários por absoluta falta de tempo/ conhecimento dos vossos conteúdos. Muito obrigada pelas opiniões que aqui expressaram, que, na verdade, não precisam de resposta, pois valem por si.

    Voltem sempre!

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