23/01/2017

pânico

Chega uma dor fininha, anunciando mansamente aquela outra que já conhece tão bem, pesada, insustentável, asfixiante, a comprimir o esterno e a amassar o coração. Toma-lhe o corpo, bloqueando-lhe a cabeça, congelando o pensamento a menos dez. É uma estátua à chuva, uma árvore vergada sobre a sua própria sombra, que se faz imensa, alguém despido na praça pública, no temor de ser descoberto, denunciado como ladrão da harmonia da paisagem e da sincronia lógica das gentes. Um labirinto mental, cuja única libertação parece ser a fuga em frente, em auto-defesa, saindo do local onde começou o auto-ataque. Sair — sair dali, ordem incontestável, proferida e obedecida cegamente, como a um bombeiro em pleno incêndio; respirar pela barriga; beber qualquer coisa com gás, obrigando o corpo a expelir pela boca todo o ar de que precisa, mas que o esmaga sem dó.
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Lembro-me muitas vezes do ratinho de laboratório, fechado num frasco de vidro, que vi uma vez na aula de Ciências, no liceu, e pelo qual pedi — eu, e muitas meninas (não posso afiançar se algum rapaz o fez) — misericórdia, sob a forma de abertura da tampa. Que lhe foi concedida, por uma professora igualmente condoída da angústia do animal. Talvez se tratasse da demonstração prática de que não vivemos sem ar, ou que o ar se esgota, ou que o ar ocupa espaço e é consumível. Não me lembro da finalidade da experiência, com a qual não aprendi nada do que era proposto. Só mesmo a conclusão que dela me ficou: o pânico é aquilo.