18/06/2013

Quem não quer ser lobo, não lhe veste a pele - ditado # 4

Este ditado não me inspira. Quando era pequena tinha medo de lobos, não só porque me identificava com o Capuchinho Vermelho (achava-a queridíssima por levar o farnel à avó e compreendia perfeitamente que ela tivesse atalhado o percurso, lixando-se. E também me matava de curiosidade por saber o que é que ia debaixo do paninho da cesta), como também porque uma pessoa ignorante com quem tive que lidar me convenceu que o lobo me vinha buscar se eu não comesse tudo. Está bem de ver que eu já era elegante e preocupada com a linha, a estúpida criatura é que era visceralmente incapaz de perceber essa evidência.

Mas hoje, em duas situações distintas, percebi o alcance do ditado e já não podia ir deitar-me sem vir aqui dizer porquê. 

Situação 1 - Tive que apanhar um táxi para me deslocar do ponto A para o ponto B (até aqui tudo claro?). Quando entrei, tive que reparar no motorista pelo simples motivo que passo a descrever: muitos anos de vida (tipo a canção dos parabéns, naquela estrofe final), voz de pífaro, Menina, quer ir por onde?, cabelo todo branco, cortado à escovinha, sobrancelhas pretas, depiladas (foi aí que...), casaco anos 80, muitos chumaços, muitos apliques, muitos fechos e botões, muito menear de ombros. Tudo me teria passado despercebido se não fossem as sobrancelhas depiladas. Quem não quer ser um taxista gay, não depile as sobrancelhas.

Situação 2 - Fim do dia, metro. Sentou-se à minha frente um magro, todo de ganga (denim look total, portanto), cabelo à Zé Manel e óculos de sol espelhados. Não foi preciso ser muito perspicaz para perceber que os olhos do Zé Manel se pregaram nos meus joelhos logo de caras. Começo a ponderar a possibilidade de vender bilhetes para o visionamento destes joelhos, independentemente do motivo que leva os passageiros a fixarem-se neles com esta frequência. É indecente que todo o histérico entre aos gritos no metro com uma lata na mão, ou a tocar uma sanfona criminosa e receba umas moedas por isso, sendo que eu vou ali quietinha, não incomodo ninguém, vou a dar o meu espectáculo e não recebo nada por isso. Mas adiante. O Zé Manel era ladrão. E eu tenho problemas com ladrões, assunto por acaso pouco desenvolvido neste meu buraco. Topamo-nos à légua, temos topanso recíproco, alta química. Não sei o que é que vêem em mim, uma vez que não me encho de pedras preciosas nem de ouro. Mas devem encarar comigo e pensam: "Eia, esta é fácil. Fragilzinha, saltos altos, anelzinho, relógio fixe, brinquinhos à maneira, vai na volta a malinha vem cheia dele". Enquanto isto, eu penso: "Olha lá, ó Zé Cabra, mas tu achas que eu nasci ontem e ainda não te topei o estilo? Óculos de sol num interior usam as gajas que levam porrada em casa. Tu ladras-me se eu deixar. Ão-ão". É só o que o ladrão necessita: que o olhemos nos óculos por cerca de 10 segundos seguidos. É esse o preço da liberdade para quem não quiser ser gatunado. Este Zé, como todos os que já passaram na minha vida, desistiu ao primeiro round ocular. Acredito que a linha do pensamento "Gamo-a - violo-a - mato-a" lhe foi interrompida. Azar dele. Ninguém o mandou ter pinta de ladrão. Quem não quer ser ladrão, não calce uns óculos de sol espelhados num interior.

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