01/02/2017

fita branca

Entra-me no silêncio do quarto e aninha-se no meu descanso, toda ela.
(Lembro-me da revolução que operou dentro da minha barriga, das cambalhotas e espreguiçadelas que já adivinhavam grande atleta.)
O cabelo, lindo e brilhante, cada vez mais liso.
(E tinha uma cabeleira encaracolada que era uma festa de alegria e movimento, quando começaram as cambalhotas cá fora.)
O perfil que a desenha perfeita.
(A primeira vez que lhe vi o perfil, tinha quatro meses de gestação, e pensei perfeita.)
Diz-me que vai comprar as fitas de finalista. 
(Não percebo como é que ontem estava cá dentro e hoje já compra fitas de finalista.)
Esclarece-me que as brancas são para as pessoas mais importantes.
Tu vais ter uma branca.
E eu surpresa, lisonjeada, agradecida (também à vida).
Também vou comprar uma branca para os pais da Carolina. 
Cai-me aquilo como um mergulho inesperado em águas fundas e escuras e geladas, logo feitas lago translúcido.
A Carolina? Referes-te à Carolina?
A Carolina morreu no final do primeiro ano do curso. Filha única, deixou pais órfãos, pais únicos. 
Sim, mãe, ela também acabava o curso este ano e os pais não têm nenhuma fita branca para assinar.

[Perfeita.]