24/05/2013

O ar que sai do rabo não é um ar agradável


Terei que fazer o desenho, explicar em língua estrangeira (que só conheço duas, ai coitadinha de mim, sou tão inculta, para além desta em que escrevo), ser um pouco mais vernácula e dizer abertamente - abertamente, o termo é uma associação de ideias com o que tanto me incomoda - que não se aguenta mais as pessoas que se peidam no metro? Ainda por cima, isso acontece mais vezes pela manhã, que é quando, supostamente, se vai lavadinho e limpinho. E acontece com as criaturas mais insuspeitas. Hoje foi uma mulher, nova, gorducha, com o ar mais inocente do mundo, vestida de forma completamente normal, aquele tipinho que passa despercebido em qualquer sítio por onde passa, vai, senta-se à minha frente (e só estávamos as duas naquele espaço, por isso sei que foi ela a peidosa da carruagem) e larga-se num peido que eu só tive pena que não fosse tão sonoro quanto mal-cheiroso, que sempre me dava para travar um diálogo, senão com ela, pelo menos com o ânus dela. Javarda. Pá, e depois estas gajas conseguem dar assim, lameiros, insonoros, podres. Fiquei tão irritada o resto do caminho que já só lhe via defeitos. Dentes de coelho. Queixo duplo. Cabelo de merda. Foleira. Bimbalhona. Ai que bom poder destilar tanto fel logo de manhãzinha, com este sol tão bom, só por causa do peido de uma desconhecida. O quão ardilosa é a mente de uma mulher idosa (rimei, rimei, sou amada sem saber!).

Coisas porcas, todos temos. Eu, por exemplo, só consigo falar de cocó quando estou à mesa a comer. Não me ocorre mais nenhum assunto. E só consegui sublimar um sonho recorrente, que me incomodava muito, exactamente por ser recorrente e pelo seu conteúdo (sonhava que estava sentada na sanita a cagar em pleno passeio público, mas o meu problema principal era 'Como é que eu me vou levantar e limpar o rabo sem que ninguém me veja o pipi? Se calhar é melhor subir as calças sem me limpar. Mas vou ficar com as cuecas sujas. E vão-me ver o pipi no momento em que eu me levantar para as arrear para cima'. Tortuoso? Eu não acho, mas era chato). Então, sublimei a coisa passando a deixar a porta da casa-de-banho sempre aberta, fosse para ir lá fazer o que fosse - tomar banho, defecar, urinar, cortar as unhas dos pés e quase toda a merda que se pode fazer naquele lugar solitário. Remédio santo, nunca mais tive o sonho.

Também tiro cacos do nariz quando estou sozinha na senzala que me escraviza e atiro-os ao vidro da janela, a ver se fazem 'pic'. Tenho mais pontos quantos mais pics fizer por dia. Há dias em que consigo 5 pontos, é bom. Mas isso não prejudica ninguém, só prejudicaria a pessoa que se encarrega da limpeza se os meus cacos fossem muito maiores e em muito maior quantidade do que são. A ela basta-lhe limpar todos os dias que já não acumula serviço junto à portada. Além do que os cacos são biodegradáveis, mais tarde ou mais cedo transformam-se em pó que, na pior das hipóteses, eu própria respirarei e retransformarei em cacos novos e, se tudo correr bem, maiores. Não prejudico ninguém, como a peidosa de hoje.

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