21/08/2016

Pedradas no charco

Eram sete mulheres, todas entre os cinquenta e os sessenta e qualquer coisa. Duas, em duas esteiras, as restantes sentadas de roda, quase metade de sete debaixo do colmo, a outra parte ao sol. Todas mães, algumas avós, certamente. Livres de tarefas domésticas, libertas de obrigações, preconceitos e amarras, apenas presas pela alegria do encontro, que poderia ser reencontro, foram abrindo, e depois bebendo, cervejas pretas umas atrás das outras. Bebidas directamente do gargalo, tão bem que as compreendo, tão bem que sabem bem. Duas das mulheres mais velhas começaram a falar mais alto, mais enfaticamente, mais arrastando o álcool na voz. São senhoras bem educadas, não hajam dúvidas acerca disso: vocabulário sem nódoas, bons biquínis, cabelos de cabeleireiro. Mas engrossam voz e tom, quebrando por momentos a finura do gesto e modo. Até que uma delas diz a palavra vibrador, e a praia pára. Como na história da Bela Adormecida, cada um petrifica no exacto momento em que a senhora exclama vibrador aos quatro ventos, vindos de todos os pontos cardeais: uns, a contemplar o mar, outros a conversar, outros a morder a sua bola de Berlim. Quase posso jurar que aqueles que se encontravam no mar, também quedaram, assim como as próprias ondas, de tanto espanto foi. A todos, a expressão comum de olhos em alvo, surpresa absoluta. Depois, como que arrancados da hipnose, todos recomeçaram exactamente no ponto em que haviam deixado a vida. Talvez tenha havido uma excepção ou outra: não sei onde ia eu, mas é possível que a navegar pelos meus pensamentos cheios de mar. Refeita do non sense, retomei o ciclo natural, naturalmente, a rir.
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Há meia dúzia de anos, estava numa praia da Caparica, e passou um grupo de três golfinhos no mar, atravessando a costa em saltos cadenciados. Estavam milhares de pessoas na praia, e a reacção foi mais sincronizada do que um flash mob bem treinado: novos e velhos, adultos e crianças, pararam absolutamente tudo o que estavam a fazer, dizer ou pensar, puseram-se em pé os sentados ou deitados, e exclamaram um ohhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!, de coro perfeito.
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Desta vez, apesar de o momento inesperado ter tido o seu quê de cómico, fizeram falta os golfinhos.

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