08/03/2014

Mulheres... bah.

Hoje é o nosso dia, sim senhora. Senhora, não senhor, eu disse bem, e foi de propósito. Já me cansam as almas penadas contra o dia dos namorados (eu própria, às vezes, desequilibro-me para esse lado, ai que estúpida), contra o Natal porque a celebração do nascimento do "menino" não é a fúria consumista e beca-beca, contra o Carnaval porque a-sério-a-sério é no Brasil, a morrerem de calor e a matarem-se nas vielas out sambódromo e cá chove e as meninas dos corsos têm varizes e pernas roxas do frio, contra a Páscoa porque a ressurreição não é só para teres um feriado e beca-beca, mas sabe tão bem ir à praia na Páscoa, hallelujah, hossana nas alturas, os cus para o ar ao sol, e contra tudo o que possa significar alegria, pausa no trabalho ou, simplesmente, atenção ao próximo, ai que chatos, nós sabemos que existe a burka, o véu, o sari e a mini-saia, e que existem muitas desigualdades e muitas injustiças - mas só com as mulheres? - mas hoje é o nosso dia, deixem-nos lá viver como minoria-não-minoria oprimida, celebrando o género só porque nascemos com pipi, mas alguém tem dúvidas do quão difícil é ser mulher e passar a vida inteira a ser coquette e querida dos pais, dos avós, dos tios e dos primos, todos a elevarem as expectativas em relação a nós, e mais tarde sedutoras sem jeito dos professores, simpáticas sem vontade dos chefes, manhosas em todas as relações pessoais e profissionais por sabermos que o bater das pestanas nos faz passar à frente numa série de filas e barreiras intransponíveis que a vida nos apresenta? Nós nascemos e crescemos com pêlos, senhores! Nós travamos um duro combate anti-pêlo a vida inteira! Não nos levantamos da cama, metemos um par de calções de banho no rabo e vamos para o areal coçar as coisas! Nós rapamos pernas, axilas, virilhas, algumas até buço (bigode, genitais, é um bigode!), pêlos nos dedos dos pés e até braços! Não cortamos as unhas dos pés e calçamos umas meias, vá que lavadas. Cortamos, raspamos a pele morta seca que fica à volta da unha, limamos, pintamos, esperamos que seque e ainda acontece cagarmos uma unha, ou todas. Nós não rapamos a barba e achamos que essa tarefa diária é um martírio ao qual estamos condenados para todo o sempre. Passamos base, damos rímel às pestanas para não prejudicar o momento em que elas terão que bater ao senhor da Emel, ou ao chato da repartição que não nos quer dar as indicações de que precisamos. Acertamos sobrancelhas, pintamos lábios (eu não, mas é porque sou Porca), repetimos o ritual das unhas dos pés nas mãos, esticamos, enrolamos, escovamos, pomos espuma, secador, pintamos o cabelo, deixamos de comer e corremos, pedalamos, metemo-nos em máquinas de tortura e em acrobacias impensáveis, só para estarmos, pá, bonitas. E ainda tomamos conta de uma casa, das compras, da limpeza, da roupa, lava-estende-recolhe-passa-arruma, de um trabalho mais ou menos escravizante, de filhos e febres e tosses e vomitados, das dores de toda a gente e das queixas de quem nem quer saber das nossas, e ainda temos o rótulo de chatas, deprimidas, obsessivas, malucas e falsas. Pois somos, falsas connosco mesmas, por passarmos uma vida inteira a reprimir a vontade de mandar uder o mundo e as vezes todas em que devíamos ter chorado e não o fizemos. Palminhas para nós que, apesar de não vivermos nem em guerra, nem escravatura, nem prisão, nem violência, mesmo assim, conseguimos sobreviver com os nossos pipis.

E a Ti, peço-te que me reencarnes em homem, que isto dá muito trabalho. Mas aviso-te já que serei um maricão do melhor, que aturar uma mulher uma hora já é dose, quanto mais uma vida inteira.

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