A loja do chinês do meu bairro já pertenceu a vários donos — tanto quanto me lembro, os primeiros foram o casal Zhu e Jy —, e, de há uns bons anos para cá, está à frente do negócio um outro casal, de quem desconheço os nomes, porque não os oiço conversar. Ele percebe e fala um Português cheio de LL, mas corrente. (Fico sempre a pensar o que será da vida de um chinês que não consegue dizer os LL, como Feuisberto Uorenço Uauande. Em vez de “Não estlague”, se calhar diz “não estuague”.) Já ela, é uma verdadeira desgraça, tanto a entender como a falar. Mas ri muito, com os olhos em linha, o seu carrapito e o metro e meio de altura, acha divertido tudo o que eu digo. Há-de ser porque não entende. Encontra-me na rua, eu digo “Bom dia” e é vê-la toda grisada.
Vou lá muito, à loja deles. Têm sempre mil merdinhas que, se não fazem falta, passam imediatamente a fazer. Outro dia, andava eu a deambular pelo espaço comercial asiático quando me deparei com os sutiãs da minha vida: sem aros, sem copas, sem elásticos, sem costuras. Vi os tamanhos e, dos que havia, só me servia o preto. Vai de preto nas meninas, que bem precisam de ser bem tratadas.
Gostámos tanto da peça de lingerie, que vai de comprar as duas outras cores básicas: bege e branco. Entro na loja, faço sinal à chinesa que venha comigo e ela hi-hi-hi, lá me acompanha até ao recanto das intimidades. Pergunto pelas cores, ela hi-hi-hi, apercebo-me de que não há o meu tamanho, aproveito para perguntar se dá para tirar as duas almofadas, e ela, como não percebe um boi, apesar de eu ter gesticulado, grita, enquanto simula com as duas mãos dois enormes peitos: “Glande!”. E mais dez hi-hi-his, os ombros encolhidos até lhe desaparecer o pescoço, um toque solidário no meu braço e eu: “Gostaria ao máximo de não ter que discutir sutiãs com o seu marido, mas apercebo-me de que tal é impossível”. O que a doida riu.
Foi só chegar ao balcão, dizer o que queria e, passados dias, já lá, e depois cá cantavam os ditos suportes. O homem não se riu vez nenhuma, mas, em compensação, também não chorou.