27/07/2018

Nem para assassina dou

Por acaso, outro dia estava um bocado aparvalhada, ainda em arrumações pós-mudança-pós-obras, e quis ocupar o meu tempo, a minha cabeça e as minhas mãos, não necessariamente por esta ordem. Ainda tinha um mega-saco com a maior parte da minha roupa arrecadado na arrecadação, que fica a três pisos abaixo de meu lar, isto tanto de elevador como pelas escadas, conforme dê no ginete a quem desce e depois sobe, ou ao contrário. É certo que poderia ter esperado por ajuda, que a teria minutos ou horas mais tarde, só que me dei à demanda de carregar o sacão sozinha. Contudo, eu explico: diz que um teimoso nunca teima sozinho, porém a pessoa humana leva o ditado muito além do impensável: de onde em onde baixa-lhe a teimosa que a habita a espaços, todavia amiúde (a mesma que lhe dará direito a uma medalha de papelão quando for feita a contabilidade final das boas acções e dos esforços a que poupou os seus demais), e são momentos profundamente solitários aqueles que protagoniza em consequência. Portanto, decidi transportar toda a traparia que continha o dito saco, coisa para caberem duas pessoas adultas, nem sequer enroscadas, lá dentro. 
Lá chegada, apercebi-me de que o monstro pesava um mínimo de cinquenta quilos. Ó pá, se não eram cinquenta, eram, pelo menos, sessenta. Sim, fora o que já tinha em casa, fora sobretudos e sapataria, sei agora que possuo dezenas de quilos de vestimentas. Agarrei o boi pelos cornos, que é como quem diz, segurei-o pelas duas alças, e procurei içá-lo para o carrinho de supermercado que o condomínio possui para estes efeitos, mas é o eras, nem o icei, nem o carrinho ficou quieto à espera, pois que desandava de cada vez que lhe aproximava o colosso, assim como fazem os ímanes de pólos semelhantes. Ainda encostei a viatura a uma parede, daqui não sais e alombas com isto, quer queiras, quer não, mas é que não queria mesmo, e desandou de ladecos nesta que foi a minha última tentativa de soerguer a coisa para cima do coiso. Entretanto, encontrava-me esfalfada e sofrendo de sudação copiosa, mas desisti? Não. Fiz-lhe nova pega de caras e transportei-o até ao hall dos elevadores, que fica a cerca de sei lá, pareceram-me a mim quilómetros, mas talvez uns seis metros. Depois de o pousar no chão, tirei duas breves conclusões: 
1. Não vou conseguir levá-lo ao colinho até ao elevador, e depois de lá até ao meu quarto;
2. Se algum dia matasse alguém e tivesse que me desfazer do corpo, deslargava-o no meio da praça e ia pedir ajuda à polícia, que eu não tenho forças para isto.
E foi assim que o levei de arrasto até junto de meu roupeiro, onde morri.


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