[sim, ultimamente, a minha vida está pejada destes momentos, quiçá porque a awkward sou eu.]
Estávamos distribuídos por três quartos, dois lado a lado, o terceiro frente ao nosso. Deu-se que fui à recepção do hotel sozinha, e definitivamente ou, pelo menos, provavelmente, serei pessoa que deve evitar andar desacompanhada em determinadas circunstâncias. [Eu vivo sempre no mundo da lua, tenho alma de artista, sou um génio sonhador e romântica.]
Subi pelo elevador, dirigi-me para o quarto, bati à porta (se tudo não seria muito mais simples nesta minha existência terrena se tivesse levado o cartão? Seria, mas, por outro lado, a esta hora, não estaria aqui a desabafar cenas), e ele não abriu. Foi então que vi um homem a bater à porta do quarto das minhas filhas. Isto, eram umas 11 da madrugada. Entre o revoltada e o surpresa, entabulei, solícita, porém:
- Este es l'habitación de mis hijas.
- Estás equivocada, no es.
- Ustede está equivocado. San mis hijas que están aí dentro.
- No, es una signora con una criança, y están me esperando.
- Mis hijas, lo garanto.
- Entonces, abre tu la puerta.
- Mas no tengo la tarjeta...
E nisto, bato à porta daquele quarto e, como ninguém me respondesse, esclareci o cidadão espanhol:
- Se fueran a tomar el desayuno.
Ele olhava-me com aquela incredulidade com que se olha um louco que, todavia, não tem cara de louco. Acho.
Entretanto, impaciente, mas não desesperada, convicta, mas não baralhada, resolvi angariar reforços, batendo à porta do meu quarto com mais força, clamando por cônjuge. Foi quando ouvi a água do duche a correr. Mas nem assim desarmei:
- Tu não me digas que te puseste a tomar banho a esta hora!?
Responde-me então uma voz feminina lá de dentro, do meu quarto.
E não é que nem me ocorreu que o homem podia ter arranjado outra, que até já estivesse a tomar duche, enquanto o diabo esfrega um olho (haha, esta expressão neste contexto!), ou enquanto eu ia e voltava da recepção, três pisos abaixo dali?
Caiu-me a ficha, como diz o povo. Acabou o jogo, desliguei da corrente. Algo de muito errado estava a acontecer. Ou o espanhol ou eu, encontrávamo-nos, desencontrados, numa realidade paralela.
Encostada à parede do corredor, olhei o número do quarto, que devia ser 315.
"215".
Num longo e disfarçadíssimo suspiro, baixei a cabeça, agora sim, confusa, surpresa, envergonhada, fechei os olhos um brevíssimo segundo, e, confirmando as suspeitas do homem, soltei uma sonora gargalhada, exclamando:
- Hah, enganei-me no andar!
E saí a correr, corredor afora.