A cadeira de rodas dela impedia a minha saída da loja onde se toma café, se compram revistas e jornais, se joga a sorte maldita de nunca se acertar nos números certos, mas hoje era dia de fezada (prima demasiado afastada da fé), e tinha que jogar os dados para criar a infinitésima possibilidade.
Parei diante dela, que fez tenção de recuar a cadeira para eu passar, e pedi que não o fizesse, pois podia esperar, mesmo não podendo. Uma cara muito negra, muito linda, rasgou-me um sorriso brilhante de pérolas brancas, e pediu para o balcão, logo ali, uma pastilha elástica.
De morango, especificou. E ele, que podia ter aproveitado o meu braço estendido, cometeu a delicadeza de sair de detrás do balcão para lhe ir entregar a grande e doce encomenda à mesma mão que segurava a pequena e fria moeda. Rejeitando o pagamento, sorriu de volta ao sorriso ainda não desfeito dela que eu entendi meu — quem sabe nunca se desfaz —, e disse
Não levas nada,
e eu entendi que não levava mesmo nada, para o tanto que ali deixava. Foi o instinto — não sei qual deles —, ou foi uma força qualquer que me empurrou para o balcão, para pedir, exactamente, uma pastilha de morango. Paguei-a então com moeda metálica, por ali não deixar nada.
Já na rua, toda cheia de sol, ouvi-lhe no mesmo sorriso,
Desculpe...
Ora, de quê?
Se levo tanto.
Deus, ou outra força qualquer, permita que não ganhe o prémio do jogo esta semana.
E é em dias assim que se tem fé na Humanidade...
ResponderEliminarBom fim-de-semana, LB!
AL
Completamente, ela era tão bonita e tão simpática :)
EliminarBom fim de semana, AL. Obrigada
Linda,
ResponderEliminarMuito bonito e sincero.
Os meus parabéns .
José
Obrigada, José. Mas eu sou uma pessoa igual às outras.
EliminarIsso agora ...não somos todos iguais.
ResponderEliminarBasta conduzir em Lisboa.
Ufa, por esse prisma, não mesmo!
Eliminar<3 Be
ResponderEliminarHistórias que (pre)enchem o coração. :)
ResponderEliminarHá pessoas, mesmo que sejam desconhecidos, que tê o dom de nos fazer ganhar o dia :)
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