Pediu-me a minha amiga mais Preta que fosse a uma casa de câmbios buscar-lhe dinheiro que os familiares lhe iam enviar do Brasil.
Podia a minha amiga ser menos preta e ter-me pedido que fosse ao inferno buscar-lhe granadas anti-tanque, com as cavilhas soltas, que eu iria na mesma.
(Depois, só tinha que ir levar-lhe o dinheiro a casa, que fica em Algés, a onze quilómetros da minha.)
É que eu sou este poço de abnegação, e as pessoas sabem disso. Por isso, pedem-me o impossível e eu, qual fada fadada para o bem, tiro-lhe o prefixo de negação e torno-o possível.
Tratava-se de uma quantia altíssima para os meus padrões — que, por muito coloridos, berrantes e floridos que possam ser, entendem € 1.305,00 como sendo muito dinheiro. Mil, trezentos e cinco euros. Ainda por cima, que, não sendo meus, me redobravam a responsabilidade sobre eles. Era como se transportasse dois mil, seiscentos e dez euros comigo. Tive medo de os perder e tive medo de ser assaltada. Eram dois medos com uma única causa. Só quem já passou por elas é que me entende.
Vesti-me de sem-abrigo (descalcei os meus Cubanas high heels e calcei umas sabrinas baratas. Achei importante, podia dar-se o caso de ter que fazer um sprint), disparei para o Colombo, com a minha mala amarela da Tous, que grita money-money-money-must-be-funny-in-the-rich-man's-world, e acho que entrei profundamente incógnita na casa de câmbios. Queria bastante ter posto uns óculos de sol, para intensificar o disfarce, mas calha que não tenho nem uso. Tive uns que amava com ardor, que se partiram pelas dobradiças, mais valia tê-los comprado na feira, que me tinha ficado muito mais em conta e faziam de mim a gaja mais gaja do meu espelho na mesma. Assim, fui com os olhos nus, apesar de bem abertos.
O rapaz que me atendeu contava notas em dinheiro mais depressa do que aquelas maquinetas que eles usam nos bancos, que parecem as tipas da natação sincronizada a amandarem-se para o charco. E entendeu apresentar-me a quantia dos 1.305 euros, toda em notas de cinquenta (e uma de cinco, claro). Aquilo fazia um molhinho razoavelmente volumoso, que eu não queria pôr na mala, nem tinha bolsos onde guardar. Temia ainda que algum gandulo (agora diz-se gandim, não percebi bem a evolução do termo) me visse guardá-lo e a ideia encheu-me de ânsias. É claro que podia sempre optar por levar as notas à mostra, em forma de leque e ir a abaná-las, até ao parque de estacionamento, onde, finalmente, podia trancar-me dentro do meu boi em paz e em segurança.
Depois lembrei-me que podia entalá-las no elástico da cintura das leggings. Por baixo da blusa que as tapava, por baixo do sobretudo, por muito estreito que ele seja, daria sempre para esconder lá uma edição capa dura e letras douradas d' Os Maias, quanto mais um maço de notas de cinquenta. Então, pedi ao rapaz que mas enfiasse num envelope, É que sabe, não me apetece levar escolta até ao parque de estacionamento, e ele percebeu. Disse-me que me deslocasse ali para um cantinho da loja, onde havia uma porta que, por sua vez, ia dar a um jardim secreto, onde coelhos tomavam chá com chapeleiros... ai, desculpem, esta parte é um bocadinho fantasia. Fiquei numa câmara fechada e opaca, à qual só ele tinha acesso, e foi aí que me entregou o dinheiro e o envelope. Eu meti um no outro, abri o casaco, levantei a blusinha e escondi tudo junto assim de lado, mas por dentro das calças.
Acho que fiquei com um andar um bocado esquisito, porque os bicos do envelope me iam para ali a moer os ossos (outra mentira, os meus ossos estão emigrados sob carne), e o peso dele, parecendo que não, era maior do que o da responsabilidade sobre ele. Mas tenho consciência de que me comportei quase como uma dama até ao carro, apesar de me sentir uma dealer de balalaicas nos pés. Então, subrepticiamente, dei notícias da nossa transacção. E ela, como boa brasileira, habituada a cenas de filme de acção, respondeu.
Sim, este palavrório todo só para mostrar que houve uma mulher que me chamou bonita. Eu gosto de ter anónimas recalcadas. |
Mulher bonita com dinheiro na calcinha é uma descrição supimpa!
ResponderEliminarBeijo, Lindona da calcinha recheada! :)
Cheio de samba :)
EliminarBeijo, Marioca :)
(Nunca tive uma calcinha tão valiosa!)
https://youtu.be/FrppJY7yLiY
ResponderEliminar;)
As minhas leggings, exactamente por o serem, não têm bolsos atrás :)
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