Conhecemo-nos a dançar e a rir dos nossos próprios enganos. Agora tenho uma amiga nova, daquelas que sei que vieram para ficar, de tão parecidas que somos, apesar de todas as nossas diferenças. Manda-me mensagens carregadas de erros e sem qualquer pontuação - nem mesmo pontos de interrogação nas perguntas -, o que, noutra pessoa, me provocaria o levantar de sobrancelhas e nariz, nela é só mais uma extensão de tanta genuinidade e alegria e vida interior. Fala desalmadamente, troca todos os tempos verbais, não entende expressões em Inglês e baralha palavras parecidas, mas nela é tudo autêntico, sem pretensões, sem pudores nem vergonha alguma. Em contrapartida, não faz nem diz nada para se enaltecer, é simplesmente simples. Quando estamos juntas, também eu sou mais eu, liberta que fico de manias, convenções e preconceitos, capaz de errar sem medo, que é a suprema tranquilidade a que alguém muito citadino pode aspirar. Ambas nascemos e fomos criadas em Lisboa, porém em pólos opostos da cidade, ela num bairro de intervenção prioritária, o que quer que isso signifique, eu nas Avenidas Novas. Disse-me há dias, no meio de uma gargalhada cheia de inocência, sem orgulho nem desonra, que a avó era peixeira, e isso pareceu-me delicioso.
Num jantar natalício onde estivemos, combinado que fora levarmos prenda do "amigo secreto", vi-a, no momento da troca por sorteio, agarrada a um pequeno embrulho, relutante em colocá-lo no meio da mesa. Disse-me, a voz ondulada por um timbre infantil: "Eu quero que a minha te saia a ti". Sorteadas, não saiu, e pude então verificar que se tratava de uma andorinha de louça negra, que ela, disfarçando o desconsolo, explicou a quem a recebeu: "a andorinha é o símbolo da amizade".
Dias depois, apresentou-me novo embrulho, do qual saiu um par de pequenos brincos de fantasia, porque sabe que eu não uso brincos grandes. Não sabe, porém, que eu sou tão alérgica ao níquel, que no momento em que os colocasse me rebentaria a cabeça, metaforicamente falando. Talvez outra pessoa lho dissesse no momento, mas a minha compreensão de amizade nunca mo permitiria: agradeci, guardei "para pôr na árvore", e vou usá-los depois do Natal, nem que seja pelo tempo que estejamos juntas num qualquer dia, aguentando as comichões e depois as consequências.
Comprei para lhe oferecer no Natal uma andorinha de louça negra.
tão bonito, Blue :)
ResponderEliminarObrigada, flor. Como tu e tudo o que escreves :)
EliminarTenho essas andorinhas, oferecidas pela minha irmã! E tb sofro horrores para usar uns brincos que me ofereceram mas gosto tanto da pessoa que os uso em sua honra... são comichoes boas.
ResponderEliminarXx
Na loja onde comprei a dela, havia de todas as cores. São todas bonitas, mas a preta é a clássica. E, na verdade, a amizade é de todas as cores.
EliminarÉ o que me vai acontecer: comichão, inchaço, soro, pus, crosta. E toda a zona da cabeça, atrás das orelhas, idem... Mas é isso, vale tudo :)
Olá
ResponderEliminarque lindo, digo eu que ando aqui a lutar contra o que sinto... perdi uma 'amiga' uma dessas e não encontrei substituta
se pintar os brincos com verniz, talvez resulte, a mim resulta
Olá, a pessoa insiste :)
EliminarSe a perda não foi definitiva (espero que não, salvo seja!), há sempre uma possibilidade de recuperação. Também digo eu, já agora :)
Já experimentei tudo. É uma alergia feroz, mesmo...
Mais esclarecedor este:
Eliminarhttp://lindaporcaoucheirodeestrume.blogspot.com/2015/01/alergia-ao-metal.html