A personificação da preguiça — aquele animal que sabe viver, designadamente porque o faz de cabeça para baixo, o que me parece lógico e acertado —, ao acordar, isto é, ao aperceber-me que, desta vez, que era para aí a enésima da noite, era para me levantar da cama;
Mãe: fui mãe, hoje. Mas mãe a sério, quando a ouvi chamar-me, aflita, Mãe... É que me trata pelo meu nome. Não que ache desrespeitoso, eu também não chamava mãe à minha mãe. Era mamã, ou então um petit nom cá nosso. Não que me faça diferença, mas é que me soube bem ouvir assim Mãe..., apesar de saber que foi na aflição, e, por isso, aquilo me ter disparado o coração como um tiro. E então fui mãe, num pé me pus ao pé dela. Sou tão egoísta ou tão desvalida, que hoje tenho andado todo o dia a ouvir aquela música Mãe...
Transportadora e entregadora de bens alimentares: estou farta de ir ao supermercado. Por maior que seja a encomenda do mês, passadas duas semanas já não-há-nada-para-comer;
Cozinheira: das minhas mãos têm que sair coisas que se possam comer;
Costureira: continuo a fazer coisas com as mãos e a máquina de costura;
Senhoria: e chata, também. Um aborrecimento, rendas atrasadas;
Prima: consolei a prima pela morte da cadela dela. Percebo-lhe a dor, a minha Mel faria hoje oito anos e já não faz. Nem fez cinco, nem seis, nem sete, assim como não fará nove nem dez. E continua a doer;
Profissional na minha área: apercebi-me de que fiz merda e até lágrimas me chegaram aos olhos. Nem o cansaço, nem o "só não acontece a quem não faz" — tangas de justificação para a incompetência — explicam um errozinho que é como um grão de areia numa engrenagem.
Até ao final do dia, ainda serei mais não sei quantas pessoas, resta saber em quantas delas eu serei eu.