16/05/2016

Bem podia ser uma formiga




se não me sentisse cigarra tantas vezes.
Mas tenho esta especial capacidade de reparar no pormenor que não interessa, de me saltar aos olhos o grão de areia diferente, no meio dos triliões que envolvem os pés das gentes, fora os outros, que andam pelo mar afora, adentro e abaixo.
Ontem ia a andar pela rua e vi um coração pequenino, a brilhar, no meio da calçada. Coisas de criança, há-de ter sido uma que deixou cair uma coisa tão sem e com tanta importância para o chão. Ou então, caiu de um vestido. De criança, com certeza. Mais um passo e deixei de o ver, mas queria voltar, só para confirmar. Olhei, olhei, e, por mais que olhasse, já não o via, de tão ínfimo era. Até me passou pela cabeça se não teria sido uma ilusão de óptica, daquelas do reflexo do sol nos vidrinhos que acontecem no chão das cidades. Ali fiquei, à procura, na minha intenção de formiga que não tem nada para fazer, feita cigarra, e encontrei um desses vidros pequeninos, que era um losango, e então ainda pensei que me teria enganado e, num relance — porque são décimos de segundo, os relances —, me tinha parecido um coração. Mas que não, mas que não, sussurrava-me a cigarra, vê lá bem, que está um coração pequenino a brilhar para ti, aí no meio das pedras, só tens que procurá-lo bem. 

5 comentários:

  1. Lembrei-me logo ,

    https://youtu.be/7UOG9C_D_-Y

    Viva Simone !

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    1. Olha que giro. A música é linda, mas tem uma entrada tenebrosa...

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  2. Linda ,
    Tenebrosa ? Final do Inverno e passagem para Primavera /Verão . Até o "blue " fica diferente !
    Aqui está melhor ! Adoro estes dois .

    https://youtu.be/W-cfFHd0ZKM

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    1. Pode ser, mas que queres? Meus ouvidos, meus nervos, tudo em mim numa fragilidade...
      :)

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  3. :)
    Linda és um tratado de formiga / cigarra !
    És mesmo !
    Sempre a pontuar !

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