Esta chuva que não se decide se cai, se fica, se veio para ficar, se amanhã já não está.
Lisboa é uma cidade dolorosa, quando chora assim, e nas horas amargas em que a noite chega e cai. Há horas que doem, em Lisboa.
Quando a noite cai, a chuva não.
Lisboa é uma cidade piedosa, tudo se arruma, todos cabem, há sempre lugar para mais um, acrescenta água ao feijão.
Atravessa-se, enorme, de um lado ao outro em menos de quase nada, vê-se quase tudo. Parece um ilhéu.
Lisboa é uma cidade impiedosa, toda embutida de recordações e lugares incomuns, sítios que ainda lá estão e nós já não. Tem um espelho mais reflector do que o da alma, que nos mostra o que já fomos, e deixámos de ser.
A casa onde vivi com os meus pais, intacta. Não me fica em caminho, está sempre trânsito na avenida, mas passo lá uma, duas, sete vezes por semana. Intacta, nós é que não.
A primeira casa onde moraram quando se pertenceram inteiros, inteira. Nunca lá estive, apetecia-me vê-la por dentro. Para confirmar se está mesmo lá.
A casa onde nasci, em pé.
A Feira Popular, que se vai, já foi há tanto, parece que agora volta, mudando e mudando-se, mudada.
Em cada rua do meu percurso estive toda, e estou um pouco, ou está um pouco de mim.
Talvez um dia passe por aqui e me lembre que já fui eu aqui, já fui daqui e, se calhar, tenho saudades também de mim hoje.
Por enquanto, para já, resta-me descolar de cada recanto dela os bocados de mim que a cidade guarda, invisíveis até para mim, e esperar que ela me devolva, piedosa, o que me falta, quem me falta — e, se não o puder fazer, ao menos que me guarde a mim, inatingida, inalterada, ilesa.
Tão bonito, Blue. Tão sincero e tão bem escrito. Uma cidade é do tamanho que a vemos.
ResponderEliminarUm beijinho, querida Blue :)
Obrigada, Miss Smile. É, sim. E, às vezes, tão grande, outras tão ninho.
EliminarUm beijinho, minha querida :)
Hoje a minha LISBOA, está linda!!! Quente e cheia de SOL!!!! Tão bom!!!!!
ResponderEliminarMaravilhosa, assim banhada :)
EliminarLembro-me sempre de Maluda, que dizia que Lisboa tinha horas de luz que mais nenhuma cidade do mundo tem. E acredito tanto nisto.
LB,
ResponderEliminar... " Lisboa tinha horas de luz que mais nenhuma cidade do mundo tem. " ... e uma luz diferente !
Grande verdade !
A Maluda era enorme. Não houve outra igual depois dela. E antes, só talvez Henrique Medina, noutro registo completamente diferente.
Eliminarhttps://youtu.be/-pfQYSY8jxg
ResponderEliminarE Carlos do Carmo, e Carlos do Carmo...
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